Para Yoram Binur, há clima em Israel para um processo de paz
O problema crucial nas negociações entre israelenses e palestinos é a posse de Jerusalém Oriental. Essa é a opinião do jornalista israelense Yoram Binur, autor do livro Meu Inimigo Sou Eu, recentemente lançado no Brasil, em que relata suas experiências como judeu disfarçado de árabe em Israel e nos territórios ocupados.
Em entrevista ao Estado, de Jerusalém, Binur, que se mantém em constante contato com os principais líderes palestinos, prevê uma solução para o problema da composição da delegação palestina na conferência. Segundo Binur, que é repórter nos territórios ocupados, quaisquer delegados palestinos indicados para a conferência sempre falarão em nome da Organização de Libertação da Palestina.
Binur, de 37 anos, trabalha atualmente no diário Hadashot. Foi tenente do Exército israelense, onde serviu entre 1973 e 76, e instruiu soldados em métodos de sabotagem e antiterrorismo. Binur treinou também milicianos cristãos libaneses na fronteira entre Israel e o Líbano.
A semelhança de Binur com os árabes sempre foi notada por seus amigos. A idéia de utilizar esse recurso surgiu quando Binur entrou para o jornal Kol Hair. Ele viajou para Nablus (Cisjordânia) com o jornalista Danny Rubinstein, do Davar, para entrevistar um parente do líder terrorista Abu Nidal. O entrevistado pensou que Binur fosse o intérprete árabe de Rubinstein. Daí nasceu o projeto, executado durante seis meses em 1986.
Munido de uma carta de apresentação do importante líder palestino Faiçal Husseini, para o caso de ser desmascarado e se ver em apuros, Binur partiu para a vida de impostor, segundo ele “o único modo de saber como um árabe se sente em Israel”.
Estado – Você acha que o atual processo de paz terá resultado?
Yoram Binur – Ele representa uma oportunidade. Mas a questão de Jerusalém é muito complexa. Ninguém vai abrir mão de Jerusalém Oriental.
Estado – Os palestinos vão ceder quanto à composição de sua delegação?
Binur – Eles me disseram que não há problema quanto a isso. Nesse ponto eles estão dispostos a aceitar uma solução de compromisso. Não é uma questão de nomes. De qualquer modo, sejam quais forem os delegados, falarão em nome da OLP. O importante é que o tema Jerusalém esteja na agenda.
Estado – “Eles” quem?
Binur – Faiçal Husseini e os outros membros do grupo que negocia com o secretário de Estado James Baker.
Estado – Como Husseini, Hanan Ashrawi e Zakharia al-Agha foram escolhidos para representar os palestinos?
Binur – Faiçal Husseini pertence a uma familia de líderes da Palestina anteriores a 1948 (ano da fundação de Israel). Hanan, por seus conhecidos dons diplomáticos, foi escolhida por Yasser Arafat. Al-Agha é um ativista da OLP em Gaza. Portanto, não houve problemas.
Estado – Então os EUA estão negociando com a OLP?
Binur – Exatamente. Eles não falam com a OLP em Túnis (sede da organização), mas falam com a OLP em Jerusalém.
Estado – No seu livro, você afirma que a OLP mantinha a liderança sobre os territórios ocupados. Isso continua valendo?
Binur – Sem dúvida. A OLP é, de longe, a principal força nos territórios.
Estado – E a Jihad Islâmica?
Binur – É um grupo eficiente e perigoso, mas muito pequeno: não tem mais de 50 ativistas.
Estado – Eles podem cumprir a ameaça de matar Husseini?
Binur – Podem.
Estado – Os assassinatos de colaboradores tornaram a intifada (levante palestino) uma guerra fratricida?
Binur – Não. Eles não alcançam essa dimensão. É um fenômeno entre outros, e não é o mais importante. Veja bem: eu não quero subestimar a questão. Trata-se de um problema real. Mas a proporção é pequena.
Estado – Há ambiente em Israel para o diálogo?
Binur – Seguramente. A maioria quer a paz. Mesmo os israelenses ligados ao Likud (partido do primeiro-ministro conservador Yitzhak Shamir) querem uma solução para o conflito.
Publicado no Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.