Governo de facto desaloja zelaystas de prédio público

Com base em decreto de lei que estabelece o estado de sítio, polícia impede protesto de seguidores de deposto diante de emissoras fechadas

TEGUCIGALPA – Os 55 camponeses que ocupavam havia três meses a sede do Instituto Nacional Agrário (INA), na capital de Honduras, foram retirados do prédio e presos ontem de manhã, com base no decreto que impôs no domingo o estado de sítio no país. A operação foi conduzida por 265 policiais da tropa de choque, apoiados por cerca de 100 soldados. Os camponeses não ofereceram resistência. Entre eles havia dois adolescentes, um de 17 anos e outro de 14, que segundo um porta-voz do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) foram algemados, violando normas nacionais e internacionais.

A polícia invadiu o prédio às 6 horas, obedecendo à lei hondurenha, que impede a execução desses mandados antes desse horário. O decreto proíbe a ocupação de edifícios públicos e a aglomeração de pessoas sem autorização prévia e prevê o fechamento de meios de comunicação que “ofendam a dignidade humana e os funcionários públicos ou atentem contra a lei”. Os camponeses ocuparam o prédio em 29 de junho, um dia depois da destituição do presidente Manuel Zelaya.

Segundo Ramón Navarro, secretário-geral da Associação Nacional de Camponeses Hondurenhos, o objetivo da ocupação era proteger os arquivos com mais de 600 processos de titulação de terras, iniciados pelo governo Zelaya. Do 1 milhão de camponeses hondurenhos, segundo Navarro, cerca de 700 mil têm a posse de terras, mas não seus títulos de propriedade, enquanto os outros 300 mil não possuem sequer terras.

“O governo Zelaya criou leis que beneficiam os camponeses, como a concessão dos títulos e créditos agrícolas”, disse Navarro, explicando por que o movimento apoia o presidente deposto. “Tememos que os fazendeiros desapareçam com esses processos que estão no INA.” À pergunta sobre como acha que isso vai acabar, Navarro respondeu: “É imprevisível, com esse governo golpista, e com a reação da nossa parte.”

O porta-voz da Polícia Nacional, delegado Orlin Cerrato, confirmou ao Estado que os 55 camponeses estavam presos, à disposição do Ministério Público, que averiguará se cometeram crimes. O delegado negou que os adolescentes tenham sido algemados.

Mas Héctor Espinal, porta-voz do Unicef, que acompanhava ontem os adolescentes na 1ª Vara da Infância, disse ter fotos mostrando-os algemados. “Isso infringe as leis hondurenhas”, disse Espinal. “Eles são crianças em risco, não infratores da lei e devem ser entregues a suas famílias.” O mais velho estava no INA com seu avô e o mais novo, com o marido de sua tia, ambos presos.

Acatando um chamado de Zelaya, abrigado na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa, centenas de pessoas reuniram-se ontem na frente do prédio da Rádio Globo, para protestar contra o fechamento da emissora, juntamente com o canal de TV 36.

Ambos transmitiam mensagens de Zelaya e seus partidários e foram tirados do ar na segunda-feira, também com base no decreto do presidente de facto Roberto Micheletti, que instituiu o estado de sítio. O Batalhão de Choque impediu que os manifestantes ocupassem a avenida na frente da emissora e marchassem até a sede do Canal 36, a menos de 1 km dali. Mas ninguém foi detido, segundo o porta-voz da polícia.

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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