Presidentes aparam arestas e reavivam Mercosul

Países criam mecanismos para enfrentar novas situações de crise.

LIMA – Os presidentes do Mercosul aproveitaram a posse do presidente peruano Alejandro Toledo para realizar um encontro extraordinário, no qual foram acertadas as bases para um relançamento do bloco comercial. Na reunião da noite de sexta-feira, descrita por um diplomata como uma “catarse coletiva”, para colocar os pingos nos “is” depois que cada país passou a fazer o que quis com seus impostos de importação, os quatro presidentes acertaram a criação de um mecanismo de consultas e comunicações prévias sobre eventuais alterações nas tarifas alfandegárias e no próprio câmbio.

No jargão diplomático, a tarefa dos chanceleres a partir de agora será criar um formato pelo qual se possa “institucionalizar as excepcionalidades”. Noutras palavras, os presidentes decidiram que é preciso que o bloco aceite regras de livre comércio “menos ortodoxas” do que aquelas previstas no plano original do Mercosul. A alternativa seria a dissolução, na prática, do bloco comercial. Uma das idéias na mesa é a criação do que se chamou de um “waiver quadripartite”, ou seja, uma espécie de licença prévia para os países membros ajustarem suas políticas comerciais às circunstâncias econômicas.

“Todos reconhecem que houve situações de fato que levaram alguns países a furar a TEC (Tarifa Externa Comum)”, disse o presidente Fernando Henrique Cardoso, na manhã de ontem, ao chegar ao hotel Country Club para se reunir com o presidente do Equador, Gustavo Noboa, e com o chanceler israelense, Shimon Peres, antes da cerimônia de posse de Toledo. “A questão agora é ver como vamos voltar a ter uma disciplina mais rígida”, continuou o presidente. “Todos os presidentes concordam que temos de reforçar o Mercosul e eu nem sou o mais exaltado.”

O presidente do Uruguai, Jorge Batlle, que ocupa a presidência pró-tempore do Mercosul, insinuou que as revisões da TEC são conseqüência das desvalorizações do real, estando destinadas a compensar os ganhos de competitividade do Brasil. “Se não é para haver mais surpresas, então que não haja em todos os aspectos, incluindo o câmbio”, disse Battle.

Segundo Fernando Henrique, no entanto, os países se colocaram de acordo quanto à necessidade de o Mercosul manter-se coeso para negociar com a União Européia e com os Estados Unidos. Na manhã de ontem, os chanceleres do Mercosul estiveram reunidos com o representante da Casa Branca para o Comércio, Robert Zoellick, e discutiram o formato das negociações 4+1 – os países do bloco econômico e os Estados Unidos.

Já com relação à União Européia, Batlle informou que os presidentes decidiram, antes de mais nada, analisar a oferta do bloco a respeito da liberalização do comércio dos produtos agrícolas, que é diferente das condições defendidas pelo Mercosul, de eliminação dos subsídios e das barreiras alfandegárias. Depois dessa análise, apresentarão sua contra-proposta conjunta.

O novo presidente peruano, Alejandro Toledo, também esteve na reunião. Segundo Batlle, será retomado agora o processo de aproximação entre o Mercosul e a Comunidade Andina, integrada pelo Peru, Colômbia, Venezuela, Equador e Bolívia.

A crise argentina também esteve no centro da reunião dos quatro presidentes, aos quais se juntou Ricardo Lagos, do Chile, país associado ao Mercosul. Fernando Henrique disse que o presidente da Argentina, Fernando de la Rúa, estava mais otimista do que a última vez que se encontraram, na reunião de cúpula de Assunção, em junho.

“Ele disse que o Senado deve aprovar neste domingo as medidas (de ajuste fiscal) que ele propôs”, relatou Fernando Henrique. Indagado sobre as conseqüências de uma eventual derrota no Senado, Fernando Henrique reconheceu que seria um “sinal não positivo, mas não desastroso”, porque na Argentina, assim como no Brasil, o presidente tem poderes de impor medidas provisórias, “com maior amplitude ainda”, já que lá se podem emitir decretos sobre questões tributárias, enquanto no Brasil, não.

Além disso, De la Rúa disse aos presidentes que as reservas subiram e o país tem dólares suficientes. “Houve no começo certa busca de dólar e agora parou”, observou o presidente. “Estamos torcendo pela Argentina”, declarou Fernando Henrique, comentando o apoio dos países do Mercosul à Argentina, anunciado pelo presidente do Uruguai no final da noite de sexta feira. “Quem pensar o contrário estará pensando contra o Brasil.”

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