Saída de Mubarak trouxe alívio, alegria e orgulho a quem protestava na Praça Tahrir durante a tarde de ontem
CAIRO – Ayman Emam e sua família estavam fazendo a oração das 18h na Praça Tahrir quando começaram a ouvir os gritos de que Hosni Mubarak tinha renunciado. Em seguida seus celulares começaram a tocar. Eram parentes que estavam em casa, ligando para dar a notícia. Eles não acreditavam no que ouviam. “Pensei que isso ainda ia levar mais uma semana, e que poderia haver tumulto e derramamento de sangue”, contou Emam, de 46 anos, executivo de recursos humanos de uma multinacional.
“Estamos muito orgulhosos de sermos egípcios”, disseram suas sobrinhas e seu filho adolescentes. “Mudamos o nosso destino. Sentimo-nos acima da lua. Foi uma conquista da nossa geração.” Sua mulher Mamany lembra que o que mais lhes chamou a atenção foi um grupo de mulheres muito pobres, provavelmente analfabetas, que estavam ao lado deles pulando de alegria. “Começamos a filmá-las com nossos celulares.” Emam diz que confia no propósito do Exército de organizar a transição para a democracia e não perpetuar-se no poder. “Sei que não será uma transição fácil, que há muitos grupos de interesse, mas tenho esperança na democracia e em melhores condições de vida para os egípcios.”
A secretária executiva Salwa Hosni, de 58 anos, havia chegado às 16 horas à praça, e acreditava que teria pela frente uma longa espera, depois do decepcionante pronunciamento de Mubarak na noite anterior. “Achamos que fosse levar muito tempo”, disse ela, agitando uma bandeira do Egito na brisa do Rio Nilo. Salwa confessou que não tem candidato a presidente. “Não confiamos em ninguém. Esperamos que o poder volte para o povo.”
O estudante de engenharia Hany Shiha, de 23 anos, e o farmacêutico Gamal Osama, de 26, também saíram empunhando uma bandeira na beira do rio, abraçados. “Estou cansado e feliz”, definiu Shiha, que há duas semanas protestava na praça pela saída de Mubarak. “Não consigo expressar tudo o que estou sentindo.” Se tiver a chance, o estudante diz que votará em Mohamed ElBaradei, o ex-secretário-geral da Agência Internacional de Energia Atômica: “Ele apoiou as manifestações desde o primeiro dia. Ele veio aqui e ficou do lado do Egito.”
“Estou feliz e ao mesmo tempo preocupado”, confessou Osama, que está abrindo sua farmácia própria. “Mubarak não pode simplesmente dizer adeus e ir embora com a sua fortuna de US$ 70 bilhões. Queremos que ele seja julgado e queremos esse dinheiro, que é nosso, para construir casas, criar empregos, investir no Egito.”
Para Osama, não importa muito quem será o próximo presidente, mas sim escrever uma nova Constituição e construir instituições democráticas sólidas. “Não podemos mais ter um presidente a cargo de tudo, exibindo o seu poder ilimitado. Precisamos de funções bem delimitadas, de distribuição do poder.”
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