PT dá tom moderado a documento das esquerdas

Paulo Delgado, enviado de Lula, ajuda a ‘limpar’ as conclusões do Fórum de São Paulo

 

 

ANTÍGUA – Os participantes do Fórum de São Paulo, que reúne os partidos de esquerda da América Latina, trabalhavam ontem numa declaração política, ao final de seu 11.º encontro, cujos temas principais são a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, que fundou o grupo em 1990, e a integração regional. O ponto de partida da declaração, redigido há um mês em Montevidéu, tinha um

tom marcadamente antiamericano. Sob a liderança do deputado Paulo Delgado (MG), representante do PT no fórum, a declaração final passou por uma limpeza, assumindo uma linha mais moderada.

O texto, que seria aprovado ainda ontem à noite em Antígua, na Guatemala, começa falando da “importância da vitória de Lula para a América Latina”. Mas, segundo Delgado, a declaração enfatizaria o fato de que essa vitória foi uma “construção de longo prazo”, com as eleições de prefeitos e governadores e o crescimento sucessivo da bancada do partido no Congresso.

Nos debates, era grande a ansiedade dos esquerdistas latino-americanos para conhecer a fórmula da vitória do PT. Com a ênfase na “construção democrática”, Delgado e o outro petista, Paulo

Ferreira, vice-presidente do partido no Rio Grande do Sul, procuraram neutralizar as correntes mais radicais do fórum, como os sandinistas da Nicarágua. Sobretudo entre os militantes da América Central, engajados até recentemente em guerras revolucionárias, e mais sujeitos à interferência americana, a retórica é bem menos pluralista.

Em seu discurso na plenária e nas conversas com os participantes, Delgado, vice-líder do PT na Câmara, defendeu um conceito de democracia apoiado em quatro pilares: o pluralismo, a justiça social – não só para uma classe –, a rejeição ao terrorismo e a tolerância étnica.

Os esquerdistas festejam também, no documento, a vitória do coronel da reserva Lucío Gutiérrez, que, depois de ter comandado um golpe militar no início de 2000, elegeu-se presidente do Equador no mês passado. Mesmo com esse histórico, Gutiérrez foi incluído no chamado “campo progressista”, por ter o apoio dos camponeses de origem indígena.

Alca – A declaração final defende ainda a integração dos países latino-americanos e dos blocos sub-regionais – Mercosul, Comunidade Andina e o Caribe. Essa integração regional, segundo o texto, deve ser concluída antes da formação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Nesse item, coube ao PT diluir o tom belicoso e antiimperialista esboçado por boa parte dos cerca de 800 participantes. “Nossa posição deve ser a de concorrência comercial com os EUA, não de confronto”, disse Delgado.

Outro item defende o fortalecimento das Nações Unidas e do direito internacional para garantir a paz mundial. Além da América Latina e Caribe, havia no encontro representantes de cerca de 15 países. Entre eles, enviados do Partido Socialista Baath, de Saddam Hussein, e do ditador líbio Muamar

Kadafi, que condenaram o “imperialismo americano”.

Nas conversas com outros delegados latino-americanos, Delgado, o mais assediado participante do encontro, recorreu a Pablo Neruda para interpretar os novos tempos: “Es lo mismo, pero no es igual.” Traduzindo, a esquerda deve manter seus princípios de justiça social, mas a luta agora é democrática.


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