Nas crises, Uribe é só um cidadão

Estratégia de reagir como se não fosse responsável quando há um erro deve ajudar presidente a se reeleger no domingo

 

BOGOTÁ

O principal trunfo do presidente Álvaro Uribe, na sua campanha para a reeleição, é a eficiência das forças de segurança no combate à guerrilha e ao crime organizado. Na segunda-feira, seis dias antes do pleito, 28 militares do Exército mataram dez policiais e um informante, num mal-explicado incidente de “fogo amigo”. Não é o que se pode chamar de uma boa notícia para Uribe. Mas é improvável que venha a alterar a ordem das coisas.

A divulgação de pesquisas de opinião está proibida desde o fim de semana passado, quando três sondagens distintas previram a eleição de Uribe já no primeiro turno, com cerca de 55% a 61% dos votos, seguido à distância pelo candidato de centro-esquerda Carlos Gaviria, com 19% a 24%. Mas o Instituto Ipsos-Napoleón Franco continua fazendo sondagens, para consumo interno. “A população reage muito fortemente, está todo mundo à espera de uma explicação”, disse Franco ao Estado. “O incidente pode afetar o desempenho de Uribe.” 

Entretanto, ninguém aposta em um prejuízo substancial para o presidente. Entre os colombianos comuns, assim como nos editoriais dos jornais, não se cogitou de culpá-lo. A visão geral é a de que se trata de um efeito colateral da guerra total que o governo tem conduzido contra a guerrilha e o narcotráfico, e que explica uma aprovação popular na casa dos 70%. 

Qual o segredo de Uribe?

“O incidente não prejudicará o presidente porque ele pratica muito bem a arte de ser político, no sentido de que, quando ocorrem fatos como esse, coloca-se à margem dos acontecimentos, como se fosse um cidadão comum, que está cobrando uma atitude das autoridades”, analisa o coronel da reserva Carlos Velásquez, professor de ciência política da Universidade La Sabana. “Ele assume o papel de um cidadão num conselho comunitário, que se vira para o ministro e pergunta: ‘E aí, essa obra sai ou não sai?'”

Foi exatamente o que Uribe fez nesse caso. Suas primeiras declarações, quando recebeu a notícia do incidente, foram: “Muito grave, muito grave. Acabo de dizer ao ministro (da Defesa) que essa comissão (de investigação) proceda rapidamente, que não vamos ter um segundo Guaitarilla” – referência a um incidente de 2004, em que um sargento, um cabo e dez soldados do Exército mataram sete policiais e quatro civis. A cena do crime foi remexida e corpos, incinerados. As investigações foram inconclusivas. O Ministério Público e a Justiça Militar acabaram absolvendo os envolvidos. 

Uribe é tão seguro de sua capacidade de se distanciar das falhas de seu governo que se encarregou ele próprio de lembrar o caso. “O presidente se mostrou tão surpreso quanto o resto dos cidadãos”, observa Franco.

Depois de visitar, na quarta-feira, o Departamento de Valle (oeste do país), onde ocorreu o incidente, o presidente voltou a jogar gasolina no fogo: “Algumas pessoas sérias me transmitiram hipóteses que me causaram preocupação, que obviamente não posso revelar porque tenho que contribuir com prudência para que as autoridades as estudem. Assim que tomei conhecimento, peguei um telefone e liguei para o procurador-geral, e o informei”, disse Uribe, que chegou a cometer um ato falho: “Quanta dor pelo assassinato… pela morte dos policiais.” 

Os policiais, integrantes de um grupo de elite especializado em combate ao narcotráfico, trajavam coletes e gorros com a inscrição Dijin (Direção de Polícia Judiciária). Segundo testemunhas, gritaram aos militares que abriam fogo com fuzis: “Não atirem! Somos policiais!” Aparentemente, alguns deles, incluindo o informante civil, foram alvejados de perto, a tiros de pistola. “Mataram dois, os outros fugiram, e foram atrás deles, claramente para arrematar”, acusou ontem o senador Luis Elmer Arenas, um ex-policial.

 

As suspeitas de que os militares – que estão recolhidos – poderiam ter sido subornados aumentaram ontem, com a revelação de que, na área onde os policiais foram mortos, região de sítios ao sul de Cali, a Dijin quase capturou, há quatro meses, Diego Montoya, um capo do narcotráfico sujeito a extradição para os EUA, que oferecem US$ 5 milhões por sua captura.

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