Clinton liga segurança nacional a paz colombiana

Presidente ressalta necessidade de que Bogotá suprima crime organizado, ‘para o bem dos países vizinhos’, e oferece treinamento para mais soldados colombianos

 

BOGOTÁ – O discurso proferido pelo presidente Andrés Pastrana na terça-feira, na reabertura dos trabalhos do Congresso, foi elogiado ontem pela maioria dos colombianos, além de receber o apoio do presidente americano, Bill Clinton.

As declarações de Pastrana, de que “as Forças Armadas estão preparadas para a guerra” e “a paciência dos colombianos tem limite”, lavaram a alma dos que se declaram cansados de ver a guerrilha beneficiar-se do processo de paz, sem contrapartida para o país.

“Foi importante o presidente ter dito que o país tem limites, para que as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) não pensem que estamos abertos ao diálogo sem condições e indefinidamente, e elas podem continuar se aproveitando da situação”, disse ao Estado o presidente em exercício da Bolsa de Valores de Bogotá, Juan Pablo González. Segundo González, o discurso não afetou a bolsa, ontem. “Só se o processo de paz acabar definitivamente, se sentirão os reflexos negativos na economia.”

González elogiou, também, o compromisso com o ajuste fiscal, anunciado pelo governo, que reduzirá seu orçamento, de 45,3 trilhões de pesos (equivalentes a R$ 45,3 bilhões), este ano, para 40,3 trilhões no ano 2000.

O novo vice-presidente do Senado, Ciro Ramírez, confirmou ontem que todos os setores sofrerão cortes, com exceção de um: o da Defesa. “As Farc precisam saber que a busca da paz não é uma brincadeira”, disse o senador, conservador como Pastrana. “Os colombianos estão cansados.”

Esse foi o tom geral das declarações, com exceção dos oposicionistas, que criticaram o discurso, seja pelo tom supostamente “guerreiro” ou pelos efeitos sociais perversos que poderia ter o ajuste fiscal. “É preciso dizer às Farc que não continuem brincando com a Colômbia”, disse o arcebispo de Bogotá, Pedro Rubiano, depois de rezar missa, na terça-feira, por ocasião do Dia da Independência do país.

O arcebispo condenou a execução de 11 pessoas, acusadas de “infiltrar-se” na chamada zona de distensão controlada pelas Farc desde novembro, quando o Exército se retirou unilateralmente.

As execuções foram confirmadas pelo negociador-chefe das Farc, Raúl Reyes. Segundo um relatório da Defensoria Pública, além das execuções, ou “ajusticiamentos”, intensificaram-se os seqüestros dentro da zona de distensão.

A guerrilha também tem usado a área de 42 mil quilômetros quadrados como base para preparar ataques fora dela. Com isso, o governo colombiano passou a insistir na instalação de uma comissão internacional de verificação dentro do território, pouco menor que o Estado do Espírito Santo.

A recusa das Farc levou ao cancelamento da reunião prevista para segunda-feira passada, que marcaria o início das negociações. “Sem um mecanismo de verificação, o processo de paz não é mais que um exercício estéril em meio à guerra fratricida”, enfatizou Pastrana.

O representante do presidente nas negociações com as Farc, Victor G. Ricardo, deve chegar hoje à zona guerrilheira para tentar negociar com os líderes da guerrilha, informou ao Estado uma fonte do governo.

Não foram só os colombianos que perderam a paciência. “A manipulação cínica do processo de paz por parte das Farc precisa acabar imediatamente”, disse, na terça, o porta-voz do Departamento de Estado, James Rubin.

Ontem, o presidente Bill Clinton declarou seu apoio a Pastrana e disse ser necessário, “para o bem dos países vizinhos”, que a Colômbia suprima o crime organizado. “É do interesse de nossa segurança nacional fazer todo o possível para ajudar a Colômbia a pôr fim à guerra civil e a desfazer-se da influência dos narcotraficantes”, disse Clinton. Os EUA ofereceram treinamento para mais alguns milhares de soldados colombianos no combate ao narcotráfico, inclusive em zonas guerrilheiras.

O governo colombiano pleiteia um suplemento de US$ 500 milhões, nos próximos dois anos, na ajuda econômica dos EUA para o combate ao narcotráfico, além dos US$ 256 milhões concedidos anualmente.

Segundo pesquisa da Rádio RCN, 66,1% dos colombianos estariam de acordo com uma intervenção militar direta dos EUA. Pastrana anunciou ontem à noite uma carta de Clinton nas qual o presidente americano manifesta seu apoio ao colega colombiano, mas rejeita uma intervenção militar.

A Câmara dos Representantes dos EUA (equivalente à dos Deputados) aprovou moção pedindo ao presidente americano que considere que a Colômbia vive em estado de guerra.

A guerrilha foi alvo também de condenação do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). Relatório divulgado ontem pelo Unicef denunciou a existência de “mais de 6 mil meninos e meninas” recrutados no conflito armado na Colômbia, principalmente pela guerrilha.

 

O relatório lembra que foram encontradas mais de 30 crianças entre os cadáveres dos guerrilheiros mortos pelo Exército, durante a ofensiva rebelde iniciada no dia 8. O Unicef fez um apelo para que “os atores do conflito armado colombiano desvinculem as crianças dos combates”.

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