Prefeito promete ainda mais rigor na luta contra a poluição, e diz que haverá muito trabalho para o pessoal da mídia externa
Não foi uma semana muito fácil para o prefeito Gilberto Kassab. Na segunda-feira, ele perdeu as estribeiras com um fabricante de placas que protestava na inauguração de uma Assistência Médica Ambulatorial (AMA), pilar de sua política de saúde pública. Passou os dias seguintes se explicando.
Na quinta, nova intempérie, dessa vez do clima, atazanou o prefeito: o céu desabou em 108 milímetros de chuva, um recorde de 23 anos para fevereiro, inundando e paralisando a cidade. Ao fim daquele dia longo, quando recebeu o Estado em seu gabinete para esta entrevista, Kassab havia recuperado a amabilidade e modéstia que o caracterizam.
Não confundir com complacência.’Nós vamos ser intolerantes’, prometeu o prefeito, falando do Cidade Limpa, o mais ousado programa de despoluição visual da história de São Paulo. O prefeito também prometeu que, em dez anos, as redes municipais de saúde e de ensino ‘não deixarão nada a dever’ às particulares.
Mas, espere: dez anos? Kassab, 46 anos, engenheiro e economista pela USP, ex-deputado federal, estrela do PFL, pensa no longo prazo. Em resposta a uma pergunta capciosa, o prefeito não descartou a candidatura a prefeito em 2008.
Prefeito, o senhor tem plano de saúde?
Tenho.
Será um bom sinal quando o prefeito de São Paulo usar o SUS?
São coisas distintas. O cidadão que tem plano de saúde privado não está impedido de freqüentar o sistema público. Qualquer homem público tem que ter como prioridade em relação à saúde um atendimento igual àquele que dão os planos privados. Esse é o ideal. E até acho que é possível. Daqui a alguns meses, o Hospital Tiradentes (na zona leste) vai entrar em funcionamento, e não deixará nada a desejar a um hospital privado. As AMAs nada mais são do que melhor qualidade de atendimento nos postos de saúde. É fazer com que o cidadão resolva um problema primário que não pode resolver na UBS (Unidade Básica de Saúde) sem ter de ir ao pronto-socorro de um hospital. Era uma demanda não-atendida.
Haverá prédios suficientes para eliminar o ‘turno da fome’ (das 11 às 15 horas)?
Vamos fazer 70 escolas e 22 CEUs (Centros Educacionais Unificados). Com isso, acabaremos definitivamente com o terceiro turno.
O senhor precisa de mais dinheiro para a educação?
Na educação, compulsoriamente tem de se gastar no mínimo 31% (da receita municipal). Ninguém pode falar que encontrou o caos financeiro na educação. O orçamento é igual para todos. Em dez anos, não se acabou com as escolas de lata. Essa foi nossa prioridade zero. Este ano, 31% significa R$ 4,1 bilhões – fora os convênios. Acabar com as 54 escolas de lata custava R$ 162 milhões. Demos 54% de aumento de salário, o que significa R$ 370 milhões. Em dez anos, teremos um ensino público na cidade de São Paulo que não deixará nada a dever ao ensino privado. Infelizmente, estamos correndo atrás do tempo perdido.
E para a saúde?
Pela lei, são destinados 15% (da receita municipal), fora os convênios. Investimos aproximadamente 17% nos últimos dois anos. Gostaria de ter gastado 25%, 30%, porque a demanda é muito grande. Na semana passada, contingenciamos 10% (do orçamento), para priorizar saúde e educação.
A integração com o metrô aumentou a demanda por ônibus. O que o senhor vai fazer para atendê-la?
Melhorar a qualidade, exigir a renovação da frota, como sempre rezaram os contratos e nunca foram cumpridos. Até o fim da gestão, temos o compromisso de não ter mais nenhum veículo com mais de dez anos. Até maio deve-se concluir a implantação dos equipamentos de GPS, que permitem o monitoramento da frota, com fiscalização em tempo real.
Desse jeito, as empresas de ônibus não vão financiar a sua campanha à reeleição.
Eu quero que elas prestem um bom serviço. Aliás, elas não podem financiar campanhas, porque são concessionárias.
Há um programa de reconversão para os 20 mil desempregados com a Lei Cidade Limpa?
Lógico. Depois da retirada dos outdoors, backlights, painéis, faixas, haverá um segundo momento, mais extenso, em que os pontos comerciais, indústrias, vão modificar o seus indicativos (placas com os nomes das empresas). Existem estudos para criar programas de requalificação de mão-de-obra, para que as pessoas que estão trabalhando nesse setor de publicidade possam, a partir de março, trabalhar nesse novo mercado, que é muito grande.
Quanto tempo vai levar para a cidade ficar limpa?
Em um mês e meio, a prefeitura retirou aproximadamente 5% dos equipamentos previstos. Se só ela estivesse retirando, em 20 meses, tiraria tudo, o que já é um número excepcional. Porém, as próprias empresas estão retirando espontaneamente, porque já perceberam que a prefeitura não vai voltar atrás. O exemplo do combate à poluição visual vai servir de referência para o combate à poluição do ar, da água e sonora, que já começou. Nós vamos ser intolerantes. Vamos continuar essa cruzada com mais rigor. O projeto Cidade Limpa é uma prioridade e não tem custo: é vontade política. Ao contrário. Infelizmente, vai ter multas. E a prefeitura vai cobrar o que gastar na retirada.
Na segunda-feira, alguma coisa já o estava incomodando, antes do protesto do dono da fábrica de placas na inauguração de uma AMA?
Não. Comecei a ouvir uma manifestação muito alta. Sempre que há manifestações, estou à disposição para conversar. Houve duas ou três tentativas, que não foram bem-sucedidas. Quando estava saindo, fiquei indignado de ver os familiares dos doentes pedindo para a assessoria ajudar a tirar o senhor de lá. Aí, acabei me excedendo. Já reconheci. Pedi desculpas, seja ao manifestante, seja à cidade. O que não me diminui. Errar é humano. Não cometeria esse excesso novamente, acredito. Não foi intencional. Foi emocional. Na vida, essas adversidades levam ao amadurecimento.