Taleban intensifica campanha de intimidação de eleitores e diz que tem 200 homens-bomba
CABUL – O presidente do Afeganistão, Hamid Karzai, ofereceu ontem cargos no próximo governo a seus principais adversários, na tentativa de criar um clima de união nacional, diante da violenta campanha do movimento Taleban para impedir a realização da eleição presidencial, no dia 20. Militantes taleban atacaram ontem com granadas propelidas por foguetes e tiros um comboio do ex-presidente Burhanuddin Rabbani, que fazia campanha para o principal rival de Karzai, o ex-chanceler Abdullah Abdullah, na província de Kunduz, norte do país. Rabbani não foi atingido, mas três taleban morreram no confronto com seus guarda-costas.
Karzai, que lidera as pesquisas de intenção de voto, disse que, se vencer, convidará os candidatos Abdullah e Ashraf Ghani, também ex-membro do seu gabinete, como ministro das Finanças, “para comer e tomar um chá, e dar-lhes cargos, como fez na última vez”. A menção pouco lisonjeira foi repelida pelos dois candidatos. “Não sou um candidato étnico, sectário, e sim um candidato nacional, mas não estou em busca de cargo no ministério”, rejeitou Ghani – que como Karzai e Abdullah é pashtun, maior grupo étnico do país, com 42% da população – em entrevista coletiva em sua casa ontem em Cabul. “Vamos esperar o dia da eleição e ver os resultados”, desafiou Sayyid Agha Hussein, porta-voz de Abdullah.
Pesquisa realizada em meados de julho pelo instituto americano Glevum Associados conferiu 45% das intenções de voto a Karzai, seguido por Abdullah, com 25%. No total, são 36 candidatos. Se nenhum superar a metade dos votos, haverá segundo turno seis semanas depois do primeiro. Karzai governa o Afeganistão desde 2001, quando os Estados Unidos derrubaram o governo do Taleban, por recusar-se a entregar Osama bin Laden, depois dos atentados de 11 de setembro. Em 2004, a primeira eleição presidencial do Afeganistão confirmou Karzai no cargo. Seus críticos acusam seu governo de corrupção e incompetência.
Militantes taleban em vários pontos do país, sobretudo no sul, onde se concentra a etnia pashtun, que forma o grosso do movimento, reiteraram ontem as advertências de que vão sabotar a eleição. Eles ameaçaram cortar o dedo dos eleitores marcado com a tinta indelével que indica que a pessoa votou. Panfletos distribuídos nas ruas e bazares, cartazes colados nas paredes de mesquitas e mensagens transmitidas por rádios clandestinas ameaçaram os eleitores com “forte punição”.
O Taleban afirma ter preparado 200 suicidas para explodir-se nos locais de votação no dia da eleição. “Ainda que houver cem explosões, vamos sair e depositar nossos votos”, afirmou ontem Karzai. Abdullah também desafiou o Taleban ao realizar um comício na quarta-feira em Kandahar, no sul do país, um dos principais redutos do movimento. Karzai abriu sua campanha no mês passado na cidade, sob forte esquema de segurança. Depois disso, evitou aparições públicas, voltando a expor-se apenas na sexta-feira, num comício no estádio de futebol de Cabul, onde o Taleban realizava execuções públicas.
As eleições – que além do presidente vão escolher também deputados das províncias (prefeitos e governadores são nomeados pelo presidente) – coincidem com uma escalada dos ataques do Taleban, e com a reação dos Estados Unidos, que este ano estão duplicando a sua presença militar no Afeganistão. O número de soldados americanos, que era 32 mil há um ano, deve chegar a 68 mil até o fim deste ano. Somando-se ao contingente da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), no total há 101 mil soldados estrangeiros no país. Mas a segurança no dia da eleição estará a cargo dos 83 mil policiais e 92 mil militares afegãos treinados pelas forças da Otan, que só intervirão em caso de necessidade, para evitar a imagem de uma votação tutelada por estrangeiros.
As forças da coalizão que reúne a Otan e os EUA informou ontem que três de seus militares morreram ontem na explosão de um artefato improvisado, colocado numa estrada no sul do país, sem fornecer mais detalhes. Mais de cem soldados da coalizão já morreram desde o início de julho, o mais sangrento desde a invasão do Afeganistão, em outubro de 2001. No total, nesse período, foram mortos mais de 1.300 militares da coalizão.
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