General diz que oficiais desobedeceram líder

CARACAS – O general Néstor González, ex-comandante da Escola Militar do Exército, afirmou que o presidente Hugo Chávez tentou, na noite do dia 11, ativar o chamado Plano Avila, pelo qual todas as guarnições das Forças Armadas assumiriam o controle sobre as respectivas regiões do país.

Mas o alto comando não obedeceu a ordem, e aí começou a sublevação.

Em entrevista concedida ao jornal El Universal, antes de se entregar às autoridades, González afirmou, também, que o presidente concordou em renunciar, desde que o deixassem partir com a família para Cuba, mas a condição rejeitada.

No atordoante tiroteio de versões que se instalou na Venezuela depois do golpe seguido de contragolpe do fim da semana passada, o interessante dessas afirmações é que elas não estão em contradição com o que disseram outras duas testemunhas-chave do que ocorreu na noite de quinta-feira no Palácio Miraflores: o presidente da Conferência Episcopal Venezuelana, monsenhor Baltazar Porras, e o próprio Chávez – embora ele negue, no atacado, as implicações desses dois gestos seus.

Chamado por Chávez para ser o garante de sua integridade física no momento em que os militares o obrigavam a abandonar o poder, o monsenhor contou na terça-feira ao programa Eu Prometo, da emissora Globovisión, que o presidente disse aos militares que queria ir para o exterior com a família.

Os militares negaram o pedido – depois de consultar o constitucionalista Alan Brewer-Carías, ligado à oposição, que considerou que a imagem das Forças Armadas seria “manchada” se elas liberassem o presidente antes de responder pelas mortes de manifestantes anti-Chávez diante do palácio, naquela noite.

Na entrevista coletiva de segunda-feira, Chávez disse ter imposto as seguintes condições para abandonar o cargo: “O respeito à vida e à integridade física e os direitos humanos de todos os que me acompanharam neste governo, de todos os meus soldados e oficiais que aqui estão leais comigo e, em última instância, da minha família e de mim mesmo. E que se respeite a Constituição.” O termo “abandono de cargo” era vital porque a Constituição prevê que ele tem de ser declarado pela Assembléia Nacional, na qual Chávez mantém maioria absoluta, ainda que por poucas cadeiras.

A decisão foi comunicada, pelo telefone, ao procurador-geral das Forças Armadas, general Lucas Rincón Romero, que estava no Forte Tiuna, sede do Ministério da Defesa e, naquela noite, quartel-general dos rebelados. Quando foi transmiti-la aos comandantes sublevados e em entrevista coletiva, Rincón disse que o presidente havia “renunciado”, e ele e os outros comandantes das Forças Armadas também punham seus cargos à disposição.

O constitucionalista Brewer-Carías avaliou que não era necessário documento firmado, e a decisão incluía a destituição do vice-presidente Diosdado Cabello, o único mencionado na Constituição como integrante da linha sucessória. É assim que os golpistas justificam a designação de um presidente provisório, o empresário Pedro Carmona, que, ato contínuo, dissolveu a Assembléia, para que ela não interviesse.

González afirma que Chávez ordenou ao comandante das Forças Armadas, general Manuel Rosendo, que pusesse em ação o Plano Avila, mas ele se recusou, pressentindo que isso desencadearia uma repressão brutal contra a população, quando havia cerca de 600 mil manifestantes antichavistas nas cercanias do palácio. Chávez recorreu, então, ao general Jorge García Carneiro, comandante da 3.ª Divisão de Infantaria, em Caracas, que passou a dar as instruções para mobilizar as tropas. “O presidente queria utilizar os tenentes-coronéis e demais oficiais subalternos para arremeter contra a multidão e contra nós”, diz González.

E o que diz Chávez? “Mandei chamar o batalhão de tanques. Não para fazer fogo contra ninguém. Sou incapaz de mandar disparar um tanque, a não ser contra outro tanque. Mas o tanque é uma arma de bloqueio e de dissuasão. Foi um recurso que ficou. Depois foram para o Forte Tiuna. Não foram utilizadospara nada.” E, noutro trecho: “A essa altura, eu já não tinha unidades militares a não ser a Casa Militar, o Regimento da Guarda de Honra”, para acrescentar, mais adiante, que comandantes de batalhões de tanques, de cavalaria e de infantaria começaram a lhe telefonar.

Incluindo uma brigada de 40 tanques MX-30, cujo comandante lhe disse: “Todos os meus oficiais e minhas tropas estão contigo e com a Constituição. Mais de 15 batalhões comandados por tenentes-coronéis.”

 

González, que um dia antes do golpe pediu a renúncia de Chávez, acusando-o de traição por proteger a guerrilha colombiana, tem prestígio nas Forças Armadas. “É um homem impecável”, disse ontem ao Estado o coronel da reserva José Maquillanda, conceituado analista militar, professor da Universidade Simón Bolívar, de quem González foi aluno. No intrincado quebra-cabeças em que se transformou o 11 de abril, algumas peças da versão de González se encaixam misteriosamente no relato de Chávez.

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