Presidente da Polônia é interessado na ‘reformulação da arquitetura de poder no mundo’
VARSÓVIA – O presidente Fernando Henrique Cardoso desembarcou ontem em Varsóvia às 12h45 (8h45 em Brasília) e se hospedou no Palácio Belweder, residência para visitantes oficiais. Depois de caminhar pelo centro ao lado de dona Ruth e da neta Júlia, de 12 anos, Fernando Henrique e comitiva entraram num espalhafatoso comboio, que parou a capital polonesa, e seguiram para a Praça dos Heróis do Gueto de Varsóvia.
No antigo bairro murado para onde as famílias judaicas foram transferidas à força por volta de 1940, soldados com roupa camuflada vigiavam de binóculo na cobertura de um edifício. No total, 40 agentes participam da segurança do presidente. Do comboio, fazem parte um microônibus do Exército e uma UTI móvel. A parafernália é praxe polonesa, em visitas oficiais.
Fernando Henrique será recebido hoje de manhã pelo presidente Aleksander Kwasniewski. “Ele é muito interessado na reformulação da arquitetura de poder no mundo”, comentou Fernando Henrique. “O Brasil tem muito interesse numa aproximação crescente com a Polônia. Além do mais, nós temos no Brasil uma população polonesa importante”, acrescentou, referindo-se à comunidade de 1,5 milhão de poloneses e descendentes.
O presidente realçou também o fato de que a Polônia pagou US$ 2,5 bilhões da dívida contraída na década de 70 na forma das populares polonetas. A suspensão do pagamento, nos anos 90, foi ponto de atrito entre os dois países. Fernando Henrique participa hoje do encerramento de um seminário de empresários, com a participação de 52 executivos de 33 empresas. “A Polônia está comprando muito material do Brasil”, enfatizou o presidente.
O Brasil tem tido pelo menos há cinco anos superávit no comércio com a Polônia. No ano passado, exportou US$ 168,2 milhões e importou US$ 105,3 milhões. Os principais itens da pauta de exportação brasileira são aviões, fumo, resíduos de óleo, minérios de ferro e partes de veículos. A Embraer vendeu 15 jatos regionais para a companhia aérea polonesa LOT. O vice-presidente da companhia para relações externas, Henrique Rzezinski, de origem polonesa, participa do seminário de hoje, assim como os presidentes da Belgo-Mineira, Antônio José Polanczyk, e da Vale do Rio Doce, Roger Agnelli.
Os dois presidentes firmam hoje um acordo fito-sanitário e outro zoo-sanitário, abrindo caminho para inspeções recíprocas e a venda de carne brasileira. “A Polônia está crescendo economicamente e se reestruturando”, diz Francisco Glitz, diretor do escritório de comércio exterior Frico, de Porto Alegre. A empresa, que está se especializando em Leste Europeu, pretende intermediar a venda de couro, cutelaria, medicamentos naturais e têxteis. Segundo ele, o mercado polonês é um dos mais exigentes da região e sua conquista abre caminho para a entrada noutros mercados.
À noite, Fernando Henrique foi a um concerto, na Filarmônica de Varsóvia, da pianista brasileira Rosana Diniz Cardoso. Seu marido, Carlos Joaquim Inácio Cardoso, primo do presidente, chegou ontem de maca ao Hotel Sheraton. Sob a nevasca de sexta-feira em Estocolmo, ele escorregou no gelo e quebrou o pé direito. Rosana tocou a abertura de O Guarani, de Carlos Gomes, Valses Humoristiques, de Alberto Nepomuceno, e Formas Brasileiras, de Hekel Tavares.
‘EU SOU ROMÁRIO’
A ligeira ascensão, nas sondagens, dos pré-candidatos da aliança que sustenta o governo — Roseana Sarney, do PFL, e José Serra, do PSDB – não sensibilizou o presidente Fernando Henrique Cardoso a romper um hábito que ele diz ter cultivado sempre, mesmo quando foi candidato: não comentar pesquisas. “De lá para cá melhorou, no caso do governo”, celebrou apenas, em rápida conversa com os jornalistas, enquanto passeava pelo centro histórico de Varsóvia.
“Os dados são sempre irrefutáveis”, admitiu o presidente, ressalvando, no entanto, que eles captam a realidade de um instante somente. À pergunta sobre o que achava da queda do pré-candidato do PT, Luís Inácio Lula da Silva, enquanto sua popularidade subiu, o presidente respondeu: “Eu não acho. É você que está dizendo.” Os jornalistas então resolveram mudar de assunto e perguntaram se ele apoiava a convocação de Romário para a seleção. “Ah, eu sou Romário, eu sou Romário”, repetiu o presidente.
Soou como uma retribuição. Três anos atrás, no calor da crise da desvalorização do real, o jogador, depois de marcar um gol, ergueu a camisa do uniforme para mostrar a mensagem na camiseta de baixo: “Eu sou FHC.”
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