Oposicionista decide remover acampamento para permitir que Exército desfile na data nacional mexicana, dia 16
CIDADE DO MÉXICO – O líder oposicionista Andrés Manuel López Obrador anunciou ontem um recuo tático para evitar um confronto com o Exército. López Obrador, que não aceitou a derrota na eleição presidencial de 2 de julho, alegando irregularidades na campanha e fraude na contagem de votos, decidiu retirar seus partidários, que ocupam há 43 dias a Praça da Constituição e a Avenida da Reforma, precisamente os locais onde tradicionalmente se realiza a parada militar de 16 de setembro, o dia da independência mexicana.
Em sua “assembléia informativa” na Praça da Constituição (também chamada de Zócalo), em frente ao palácio presidencial, onde reúne diariamente os seus simpatizantes, López Obrador “propôs” – as decisões importantes são referendadas por aclamação – que os cerca de 4 mil militantes levantem acampamento na noite de sexta para sábado, para que o Exército possa fazer o seu desfile na manhã do dia 16. Às 15h, os militantes voltarão ao Zócalo, para realizar a sua “Convenção Nacional Democrática”, que lançará um governo paralelo e uma assembléia constituinte. Segundo ele, há 500 mil “delegados” credenciados para a convenção. O objetivo é chegar a 1 milhão.
“Vamos permitir que o Exército mexicano leve a cabo o desfile militar como o programou o Ministério da Defesa”, disse López Obrador, a uma multidão de cerca de 10 mil pessoas que lotou a praça durante a manhã de ontem. “Respeitamos essa instituição fundamental para a soberania nacional. E que nunca mais o Exército seja usado para reprimir o povo que luta pelas idéias de liberdade, justiça e democracia.”
Havia uma expectativa quanto à decisão de López Obrador – de retirar-se ou enfrentar as forças de segurança -, que definiria o rumo do movimento. Ao anunciar o discurso do líder, a oradora que faz as vezes de “âncora” no palanque resumiu a ansiedade: “Estamos muito inquietos. Tivemos muitas dúvidas essa semana. López Obrador está aqui para esclarecer.”
“Não é fácil encontrar a saída”, admitiu o líder oposicionista, num discurso de 40 minutos. “Colocam-nos numa situação muito complicada. Não só nos fraudam, mas nos deixam com a responsabilidade: se o movimento se desborda, vão dizer que é violento; se fica passivo, vão dizer que enfraqueceu, afrouxou.”
Na verdade, a ocupação da Avenida Reforma, uma das principais artérias da capital, custou caro aos oposicionistas. Segundo as pesquisas, depois da eleição, o apoio a López Obrador caiu de metade dos eleitores para um terço. O prejuízo causado nos setores de comércio e serviço com a ocupação do centro da cidade é estimado em 7 bilhões de pesos (US$ 636 milhões), resultando na demissão de milhares de pessoas. “Votei em López Obrador, mas não votaria de novo”, disse o motorista de táxi Gutiérrez González. “Os políticos são todos iguais, só pensam neles.”
López Obrador, que segundo o resultado oficial perdeu a eleição por 233 mil votos (0,56%), exige a recontagem e se considera presidente eleito, se encarregará de fazer o próprio “grito de independência”, na madrugada de sábado. A decisão foi tomada depois que o porta-voz do presidente Vicente Fox confirmou que ele fará o grito no palácio, diante do Zócalo, como reza a tradição. Os simpatizantes de López Obrador, que ainda estarão no local, deverão voltar as costas para Fox.
Depois de anunciar suas “propostas”, López Obrador perguntou à multidão: “Estão de acordo? Levantem as mãos.” A maioria levantou, e ele selou a decisão: “Aí fomos.” A assembléia foi encerrada com o hino nacional: “Mexicanos, ao grito de guerra…”
Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.