Calderón quer ‘diálogo maduro’ com Lula

Em entrevista exclusiva ao Estado, presidente eleito não esconde diferenças de visões e estratégias entre México e Brasil

CIDADE DO MÉXICO – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva se tornou um dos primeiros chefes de Estado a reconhecer a vitória de Felipe Calderón na eleição de 2 de julho, enviando-lhe, na quarta-feira, uma carta de felicitações. Não é pouca coisa, diante da virulenta resistência do candidato opositor em aceitar a derrota – e do fato de Lula estar bem mais alinhado, ideologicamente, com Andrés Manuel López Obrador do que com o presidente eleito.

Em entrevista exclusiva ao Estado, Calderón não tentou esconder as diferenças de visão e de estratégia com Lula em relação à integração regional, mas deixou as portas abertas ao diálogo com o governante do outro país mais importante da América Latina – que, ao que tudo indica, também estará no poder pelos próximos anos. “Procurarei detonar uma relação produtiva e madura com o Brasil”, disse Calderón. “Ambas as nações devem interagir na definição de mecanismos que garantam que a América Latina não deixe de ser uma região geopolítica e geoestrategicamente relevante no mundo.”

“No entanto, devemos partir de um reconhecimento medular de que, em alguns momentos, o México e o Brasil terão visões e interesses regionais e globais divergentes, mas isso não implica nem rivalidade nem confrontação”, continuou Calderón, que, como o atual presidente Vicente Fox, privilegia as relações com os EUA. O Estado lhe perguntou então se o México seguirá olhando para o norte. “A disjuntiva que supostamente existe, segundo observadores e atores regionais, entre a participação mexicana em mecanismos de concertação e integração regionais na América Latina e sua ancoragem na América do Norte, mediante o Nafta, é um falso dilema”, respondeu ele. “O segundo não anula o primeiro.”

“O México, como faz o Brasil com outras nações e blocos extra-hemisféricos, tem a vontade, a capacidade e a necessidade de estabelecer um andaime regional de interlocução sólida, à medida que abre outros espaços diplomáticos e comerciais”, prosseguiu o presidente eleito. “Acreditamos que o futuro da América Latina requer a construção de equilíbrios nos quais o México deve estar presente.”

Mais cedo, em entrevista coletiva à imprensa internacional, Calderón defendeu a liberalização do comércio, mas insistiu que a formação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca) e mesmo a participação no Mercosul devem ser norteadas por interesses comerciais, não ideológicos. “A discussão da Alca se desenvolveu dentro de uma polêmica político-ideológica”, criticou. “Eu gostaria muito de poder discutir esses temas por seus méritos, ou seja, que possamos discutir a Alca ou qualquer outro tratado em termos de que benefícios reais tangíveis e também de que custos podem significar para nós.”

Durante a Cúpula das Américas, em novembro, em Mar del Plata, Fox insistiu na criação da Alca, entrando em choque com o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que o chamou de “filhote do imperialismo”. Os dois países chamaram seus embaixadores de volta.

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