Mesa nomeia gabinete técnico, com dois indígenas

Ministério da Defesa ficará com militar, na tentativa de melhorar relações com Exército

 

LA PAZ – O novo presidente da Bolívia, Carlos Mesa, anunciou ontem à noite a composição de seu gabinete, predominantemente técnico, como havia prometido. Entre as novidades, está a nomeação de dois ministros de origem indígena: o dos Assuntos Indígenas e Povos Originários, Justo Seoani, e o da Educação, Donato Aima Rojas. Outro tema candente no governo anterior também ganhou uma pasta: a da delegada presidencial anticorrupção, Guadalupe Cajías, que era assessora de Mesa.

Para o delicado cargo de ministro da Defesa, foi nomeado o general Gonzalo Arredondo Pilar, comandante do Exército no governo do general Hugo Bánzer (1998-2000). Mesa rompeu na segunda-feira com o governo de Sánchez de Lozada em repúdio à violência com que as forças de segurança reprimiram os manifestantes que exigiam a sua renúncia, resultando na morte de cerca de 70 pessoas em seis semanas de distúrbios.

Dos 15 nomes anunciados ontem, o único que já havia integrado um gabinete é o novo ministro do Desenvolvimento Econômico, Javier Nogales, que chefiou a pasta da Habitação no governo de Jorge Quiroga (2000-02) e presidiu o Banco Central no de Hernán Siles Suazo (1960-64). Mas Nogales é tido como “independente”. Já o novo ministro da Fazenda, Javier Gonzalo Arguedas, é um desconhecido da imprensa boliviana.

“É a primeira vez que temos um governo sem partidos”, disse Mesa, historiador e jornalista eleito vice-presidente na chapa de Sánchez de Lozada em julho do ano passado. “Não ignoro a importância dos partidos para a democracia, mas é preciso reconhecer a crise dos partidos, não só com o Estado, mas com a sociedade.” Apelando por apoio no Congresso, Mesa dramatizou: “Estamos jogando com a vida e o destino da pátria.”

O presidente do Senado, Hormando Vaca Diez, do Movimento de Esquerda Revolucionária (MIR), defendeu a permanência de Mesa até o fim do mandato, em agosto de 2007. Ao tomar posse, no fim da noite de sexta-feira, Mesa anunciou que conduziria um governo de transição, com a convocação de Assembléia Constituinte e de nova eleição. “O país não agüenta passar por novas eleições”, disse o senador. “O Congresso tem de apoiar o presidente.”

“Vamos dar apoio à continuidade do regime democrático”, garantiu Manfred Reyes Villa, líder da Nova Força Republicana, que detém 25 das 130 cadeiras na Câmara dos Deputados. “Para isso, não necessitamos estar no governo.” Reyes Villa deixou a coalizão horas antes da renúncia de Sánchez de Lozada, na sexta-feira, acabando, assim, com a sua maioria de dois terços no Congresso.

O único ministro com forte passado de militância partidária é o do Governo, Alfonso Ferrufino Valderrama, que foi deputado pelo MIR entre 1982 e 85. Ferrufino deixou o MIR e ajudou a fundar o Movimento Bolívia Livre. Ultimamente, vinha trabalhando em estudos sobre reformas da Constituição na equipe de Mesa, na vice-presidência.

O novo ministro da presidência, José Galindo, um empresário de Cochabamba, também já trabalhava na equipe de Mesa, no cargo de secretário-geral da vice-presidência. A essa equipe também pertenceu o novo ministro do Desenvolvimento Sustentável, Jorge Cortez Rodríguez.

Foi nomeado ministro das Relações Exteriores o diplomata de carreira Juan Ignacio Siles del Valle, filho de diplomata e sobrinho do ex-presidente Hernán Siles Suazo.

“As relações com o Brasil vão ter uma importância extraordinária”, disse o presidente, numa rápida entrevista depois da posse dos ministros. “O presidente Lula me expressou total apoio”, acrescentou Mesa, que conversou com o presidente brasileiro pelo telefone. “O Brasil pode nos dar uma mão ainda maior do que nos deu até agora.”

O único ministro não definido foi o das Minas e Combustíveis. “Peço paciência aos bolivianos, mas não levará muito tempo”, garantiu Mesa. Essa á uma pasta-chave, já que o estopim dos distúrbios que levaram à renúncia de Sánchez de Lozada foi sua decisão de usar o porto chileno de Iquique para exportar gás natural para a Califórnia. Os bolivianos perderam a saída para o mar numa guerra contra o Chile, no século 19, e até hoje não perdoaram os vizinhos.


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