Ansiosos, turistas esperam a hora de voltar ao Brasil

Brasileiros passam o dia em hotel, aguardando ordem da embaixada para partir

 

LA PAZ – Um grupo de 53 brasileiros esperava ontem ansiosamente, num hotel no centro de La Paz, por um sinal da embaixada para partir. Recolhidos na segunda e terça-feira nos hotéis em que estavam e reunidos num mesmo lugar, os brasileiros foram orientados ontem a ficar de prontidão: a qualquer momento, seriam convocados a partir.

Um Hercules da Força Aérea aguardava ontem à noite ordem de decolar do aeroporto de Campo Grande. Outros dois helicópteros Super-Puma, também da FAB, foram deslocados para Corumbá, na fronteira de Mato Grosso do Sul com a Bolívia.

O embaixador Antonino Mena Gonçalves explicou aos brasileiros que, por razões de segurança, não poderia informar detalhes da operação de resgate, e pediu discrição. Atendendo a esse pedido, o Estado decidiu não divulgar a localização dos brasileiros e detalhes sobre a logística da operação em La Paz. Além dos 53 turistas, alguns brasileiros residentes também pediram para embarcar. A embaixada também decidiu atender a pedidos dos governos da Argentina, Uruguai e México. No total, devem ser resgatadas cerca de 70 pessoas.

Desde domingo não há vôos regulares para La Paz. Mas a dificuldade maior é chegar ao aeroporto, que fica a 15 quilômetros da capital, na cidade de El Alto. A estrada está bloqueada pelas barricadas dos manifestantes, que incluem dois vagões de um trem explodido na quarta-feira. Diante dos riscos e dificuldades da retirada, outros governos decidiram manter seus cidadãos em La Paz. A decisão de resgatar os brasileiros foi tomada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na Argentina, na quarta-feira.

Entre os brasileiros, há um consenso de que, apesar dos riscos da operação de resgate, vale a pena sair de La Paz. “O problema não são nem os riscos de ser atingido pelo conflito, mas o desabastecimento”, estima o engenheiro Roberto Santoro, de Curitiba, que chegou no dia 8, para trabalhar em obras da prefeitura de La Paz.

Todas as vias de acesso à cidade estão bloqueadas pelos manifestantes. O governo boliviano afirma que está conseguindo suprir a cidade de carne, frango, verduras, leite, etc., trazidos em aviões Hercules e comboios militares. Mas os resultados não são visíveis. O comércio está fechado desde o fim de semana. Faltam produtos básicos, como pão, ovos, gás e gasolina.

A psicóloga Natália Dias e a pedagoga Sueli César chegaram no domingo, no último vôo regular que pousou em El Alto, da Varig. Só foram informadas de que havia um levante popular na Bolívia – iniciado na sexta-feira – quando o avião pousou em Santa Cruz de la Sierra, escala do vôo de São Paulo para La Paz. Um comissário da Varig lhes disse que tinham de decidir: ou ficavam em Santa Cruz ou seguiam para La Paz ou retornavam para o Brasil.

“Tínhamos de decidir rápido, e não tínhamos informação suficiente”, lembra Natália. “Não acreditamos que o conflito fosse tão grave e decidimos vir para La Paz.” Aqui, Natália e Sueli, que vivem no Espírito Santo, pretendiam visitar os locais turísticos e depois fazer o mesmo no Peru, num total de 18 dias de viagem.

O avião pousou às 13h30, deixou os passageiros e decolou de volta. Quando foram sair do aeroporto, os passageiros descobriram que isso era impossível. A estrada já estava bloqueada. Somente às 4h30 da madrugada de segunda-feira Natália e Sueli conseguiram embarcar num táxi, chamado por uma funcionária do aeroporto, aproveitando que os manifestantes tinham ido dormir.

Do terraço do hotel onde ficaram, no centro de La Paz, Natália e Sueli assistiram aos choques entre manifestantes e polícia. E viram quando duas pessoas caíram, atingidas por disparos de munição real. “Pelo menos uma caiu morta. A outra foi levada numa ambulância”, conta Sueli, emocionada.

Enquanto aguardavam instruções para partir, Natália e Sueli procuravam acalmar seus parentes pelo telefone. “Eu sei que é um sufoco, mas a senhora pode ficar tranqüila”, disse Natália a sua mãe de 76 anos.

Natália e Sueli, que gastaram US$ 700 só em passagens, acham que a Varig deveria reembolsá-las. Aqueles que podem, estão pagando a diária de cerca de US$ 20 no hotel para onde foram levados. Para os que não podem, a embaixada está pagando. “Ficamos muito orgulhosas de como fomos tratadas pela embaixada brasileira”, contam Natália e Sueli. Segundo elas, turistas argentinos e uruguaios que vieram no mesmo vôo não tiveram a mesma assistência de seus consulados. E acabaram pegando carona com os brasileiros.


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