Agora caberá ao Congresso eleger Reyes ou Sánchez de Lozada para a presidência
LA PAZ – O ex-prefeito de Cochabamba Manfred Reyes Villa e o ex-presidente Gonzalo Sánchez de Lozada foram os dois primeiros colocados na eleição presidencial de ontem. Os 27 senadores e 130 deputados eleitos ontem escolherão o presidente entre esses dois nomes, já que nenhum candidato obteve mais da metade dos votos, como previam as pesquisas. O líder cocaleiro Evo Morales ficou em terceiro lugar e o ex-presidente Jaime Paz Zamora, em quarto.
De acordo com a boca-de-urna do Grupo Fides, o capitão da reserva Reyes, candidato pela Nova Força Republicana (NFR), obteve 21,97% dos votos.
Sánchez de Lozada, dirigente do tradicional Movimento Nacionalista Revolucionário (MNR), ficou com 20,86%. A boca-de-urna divulgada pelo Instituto Mori também coloca os dois candidatos na frente, embora invertendo as posições: 22,7% para Sánchez de Lozada e 22,3% para Reyes. Imediatamente depois da divulgação das bocas-de-urna, quando as urnas se fecharam, às 18h (19h em Brasília), um porta-voz da NFR e o candidato a vice-presidente pelo MNR, Carlos Mesa, proclamaram as respectivas vitórias.
As duas sondagens confirmam o crescimento formidável da candidatura de Morales, já indicado nas últimas pesquisas de intenção de voto, que, no entanto, o colocavam em quarto, atrás de Paz Zamora. A boca-de-urna do Instituto Mori aponta empate entre Reyes e Morales em La Paz, o maior colégio eleitoral do país. E, o que é mais surpreendente: a vitória do líder cocaleiro sobre o capitão da reserva em Cochabamba, terceira cidade do país, da qual Reyes foi eleito prefeito quatro vezes (1993-2001). Sánchez de Lozada, segundo essa boca-de-urna, venceu Reyes em Santa Cruz, o segundo colégio eleitoral.
Reyes, 47 anos, cujo slogan foi “mudança positiva”, apresentou um programa de governo de cunho nacionalista, com forte intervenção estatal. Propõe reestatizar a companhia petrolífera YPFB e rever os demais contratos de privatização. Sánchez de Lozada, 71 anos, presidente entre 1993 e 1997, tem um perfil mais liberal, mas também promete reativar a economia por meio de grandes obras públicas.
Ao lado de Reyes, o outro grande fenômeno dessas eleições é Morales, líder sindical dos plantadores de coca, expulso da Câmara dos Deputados em janeiro, sob acusação de defender o narcotráfico. Admirador de Luiz Inácio Lula da Silva, Morales defende a reestatização de todas as empresas privatizadas e a liberação dos cultivos de coca.
A pergunta mais importante para os principais candidatos ontem era com quem poderiam aliar-se no Congresso, que deve escolher o presidente até a véspera da posse, dia 6 de agosto. “Fizemos uma campanha limpa, sem ofender ninguém”, disse Reyes, abrindo caminho para as negociações, e mencionando a importância da “união nacional”.
O destino das alianças no Congresso é incerto, mas uma tendência, até ontem, era um acordo entre a NFR de Reyes e o Movimento de Esquerda Revolucionária (MIR) de Paz Zamora, para isolar o MNR. Paz Zamora e Sánchez de Lozada têm velhas contas a acertar (ler ao lado).
“Querem um furo de reportagem?”, ofereceu Paz Zamora, em entrevista em sua casa, no fim da tarde de sábado. “Goni (como Gonzalo Sánchez de Lozada é conhecido) não será presidente. Não percam seu tempo.” O candidato do MIR, que se declara “socialista”, preparou o terreno para uma aliança com Reyes, considerado um populista de direita. “É difícil caracterizar Manfred ideologicamente”, disse Paz Zamora. “Goni, eu situo perfeitamente: é um clone de Domingo Cavallo (ex-ministro da Economia da Argentina), o mais puro neoliberal da América Latina. Paz Zamora lembrou que Reyes vem do chamado “campo conservador”: do grupo do ex-ditador Luis García Meza (1980-81). “Mas ele enfrentou a realidade e adquiriu uma inquietude social quando prefeito de Cochabamba.”
O início da votação, previsto para as 8h locais (9h em Brasília), atrasou-se em muitas seções, por causa da final da Copa do Mundo. Depois do jogo, dezenas de brasileiros que vivem na Bolívia foram festejar na Avenida 16 de Julho, mas foram dispersados pela polícia, pois a lei proíbe conglomerações no dia das eleições.