Kadafi firma cerco a rebeldes de Ajdabiya

Forças leais ao ditador líbio alinham tanques em estrada que dá acesso à cidade de Benghazi, principal reduto dos insurgentes na Líbia

CAIRO – Enquanto suas tropas avançavam em direção a Benghazi, o principal reduto da oposição, e o Conselho de Segurança da ONU examinava a imposição de uma zona de exclusão aérea e outras medidas para conter sua ofensiva, o ditador Muamar Kadafi fez ontem uma aterrorizante advertência aos moradores da cidade, e ameaçou também a comunidade internacional com a interrupção do tráfego no Mar Mediterrâneo. “Não haverá misericórdia para aqueles que não se renderem”, avisou Kadafi, em pronunciamento de rádio e televisão.

“A questão está decidida, estamos chegando”, afirmou Kadafi, cujas tropas foram vistas por moradores ontem à noite a 130 km de Benghazi, depois de vencerem uma sangrenta batalha pelo controle de Ajdabiya, situada 160 km a oeste. “O povo verá amanhã (hoje) se a cidade é de traidores ou heróis”, continuou o ditador. “Não me traiam, meus amados benghazis.” A cidade, de 1 milhão de habitantes, sempre foi o principal reduto de dissidência contra o regime de Kadafi. Como resultado, seus moradores se queixam de serem prejudicados pelo governo, com precária infra-estrutura e salários mais baixos.

Kadafi disse que haverá buscas de casa em casa na cidade. “Aqueles que não tiverem armas não têm o que temer.” Muitos moradores de Benghazi, e de outras cidades da região leste, controlada pela oposição desde o levante iniciado há um mês, têm fuzis em casa, retirados dos quartéis das forças leais ao regime, que debandaram nos enfrentamentos com manifestantes civis apoiados por militares desertores. Uma faixa de 700 km a leste de Benghazi, até a fronteira com o Egito, percorrida pelo Estado na quarta-feira, ainda é firmemente controlada pelos rebeldes.

Mais cedo, a TV líbia havia exibido outra declaração de Kadafi, destinada a desencorajar a aprovação da zona de exclusão aérea e outras iniciativas de apoio aos rebeldes: “Qualquer ação militar estrangeira contra a Líbia exporá todo o tráfego aéreo e marítimo no Mar Mediterrâneo ao perigo e instalações civis e militares se tornarão alvos do contra-ataque líbio. A bacia do Mediterrâneo enfrentará perigo não só no curto mas no longo prazo”, acrescentou, sem explicar a natureza da ameaça.

Kadafi, que se reabilitou nos últimos anos perante a comunidade internacional renunciando ao terrorismo e opondo-se à Al-Qaeda, afirmou no fim da semana passada que apoiara o grupo extremista se a comunidade internacional interviesse no conflito líbio. O ex-ministro da Justiça Mustafa Abdel Jalil, que aderiu ao levante desde o início, tornando-se um dos líderes da oposição, disse que o ditador ordenou pessoalmente o atentado contra o avião da Pan Am sobre Lockerbie, em 1988. Como parte de sua reabilitação, o ditador indenizou as famílias mortas no atentado.

De manhã, os rebeldes tinham conseguido alguns ganhos no terreno. Seus aviões – obtidos no fim de semana, com a deserção de oficiais – haviam fustigado forças leais a Kadafi no flanco oeste de Ajdabiya. “Zona de exclusão aérea não nos interessa mais”, disse ao Estado, sorrindo, um morador de Benghazi. “Agora temos aviões.” Ao mesmo tempo, suas baterias antiaéreas conseguiram derrubar pelo menos dois aviões do regime. Mas no decorrer do dia as tropas de Kadafi voltaram a cercar Ajdabiya, cidade de 150 mil habitantes duramente castigada pelos bombardeios aéreos e de foguetes. A partir daí, começaram a avançar em direção a Benghazi.

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