A própria modernização da sociedade sul-africana tornou insustentável o “desenvolvimento separado”.
Com o processo de urbanização e a necessidade de mão-de-obra, os negros, cujas “reservas” se tornaram cada vez menores e menos produtivas, passaram a deixar suas terras e laços tribais. Hoje, os negros representam metade da população nas cidades, antes consideradas “área branca”. A previsão é de que no ano 2000 eles serão três quartos da população urbana.
No livro South Africa’s Silent Revolution, John Kane-Berman, do Instituto de Relações Raciais, reuniu os números da integração dos negros no país. Em 1967, apenas 7% dos estudantes universitários eram negros. Hoje, são mais de 40%. O governo gasta quatro vezes mais com a educação de uma criança branca do que com a de uma criança negra. Mesmo assim, o maior acesso dos negros à educação tem reflexos sobre a força de trabalho do país. Apenas 20% do trabalho de nivel médio era exercido por negros em 1967. Já em 1985, a cifra duplicou.
Essa revolução silenciosa nos campos econômico e social teve efeitos ruidosos sobre a política sul-africana. Em 1976, uma onda de protestos contra a obrigatoriedade do ensino do idioma africânder nas escolas negras levou a violentos confrontos entre estudantes e a polícia, deixando centenas de mortos.
Na década de 80, o Congresso Nacional Africano (CNA), principal organização negra, liderada por Nelson Mandela, intensificou sua ação política clandestina. A polícia reprimiu uma série de manifestações de estudantes, líderes sindicais e profissionais de todas as áreas – inclusive brancos – contra a segregação racial. Em 1985, o governo impôs em todo o país estado de emergência, que só seria abolido em outubro do ano passado.
A comunidade internacional também aumentou a pressão. Em 1985, as sanções aprovadas pela ONU 17 anos antes foram finalmente aplicadas, com efeitos devastadores sobre a economia do país. No total, 554 empresas estrangeiras deixaram a África do Sul, além do congelamento dos empréstimos bancários e investimentos dos EUA, países europeus e Japão.
A estratégia sul-africana na África Austral, numa guerra em que estavam em jogo os interesses das superpotências, complicou ainda mais a situação do país. Desrespeitando uma resolução da ONU que em 1966 determinou sua retirada, a África do Sul manteve até o ano passado tropas na Namíbia – antiga África do Sudoeste, ocupada pelos sul-africanos desde o final da 1.ª Guerra Mundial.
Pretória lançou inúmeros ataques a Angola, Moçambique, Zimbábue, Lesoto e Botsuana. Angola foi invadida pelo menos quatro vezes (1975, 1981, 1984 e 1988). A guerrilha pró-capitalista angolana era sustentada militarmente pelos EUA e pela África do Sul, enquanto a URSS e Cuba apoiavam o governo marxista de Angola.
Não só os guerrilheiros namíbios como os negros sul-africanos do movimento antiapartheid tinham bases militares em Angola. Sob pressão da comunidade internacional, a África do Sul recuou, aceitando a independência da Namíbia no ano passado e interrompendo a ação direta de suas tropas em Angola. O CNA foi legalizado também no ano passado, abandonou a luta armada e iniciou negociações com o governo.
No plano da política interna, foi justamente o conflito na África Austral que precipitou a queda do presidente Pieter Botha, defensor da “estratégia total” na região – onde os países da Linha de Frente (Angola, Moçambique, Zâmbia, Tanzânia, Zimbábue e Botsuana) impõem um bloqueio à África do Sul.
O presidente do PN e então ministro da Educação, Frederik de Klerk, anunciou em agosto de 1989 a decisão de se reunir com o presidente da Zâmbia, Kenneth Kaunda, para discutir o conflito. Botha se opôs à reunião. Mas a maioria do partido se alinhou com De Klerk, que liderava um bloco de reformistas antiapartheid. O presidente renunciou. De Klerk tomou posse interinamente em setembro, e foi confirmado no cargo depois de eleições parlamentares.
Teve início então o programa de reformas de De Klerk. O lider negro Nelson Mandela foi solto em fevereiro do ano passado, depois de 27 anos de prisão. Começaram logo em seguida as negociações, que culminaram em agosto no Acordo de Groote Schuur, pelo qual o CNA abria mão da luta armada, em troca da anistia a milhares de presos políticos e exilados.
O movimento negro considera, no entanto, que somente uma nova Constituição, com igual direito de voto para todas as raças, porá fim ao apartheid. Pela atual legislação, brancos, asiáticos e mestiços votam para o Parlamento tricameral. Nele, há 178 deputados brancos, 85 mestiços e 45 asiáticos. Num país com cerca de 28 milhões de negros, 5 milhões de brancos, 3 milhões de mestiços e 1 milhão de asiáticos.
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