Cidade atrai 600 mil imigrantes por ano

Maior cidade da África negra, menor apenas que o Cairo no continente, Lagos concentra um terço do PIB de R$ 212,3 bilhões da Nigéria. Sua renda per capita é pelo menos o triplo da do país, de R$ 1.454.

LAGOS – Essa efervescente economia atrai 600 mil imigrantes por ano. Não só da Nigéria. Muitos vêm de Gana, assim como o peixe que vendem nas calçadas; outros, do Benim, de onde trazem produtos de beleza e higiene.

A beninense Latifa Adeshine, de 27 anos, vive há 10 na Nigéria. Acompanhada da filha de 1 ano e meio, Latifa vai a cada duas semanas a Cotonu (maior cidade de seu país) abastecer-se de xampus, sabonetes e cremes, que lhe rendem até R$ 40,60 por dia nas ruas de Lagos. O marido vende fitas cassete. Eles têm outro filho de 5 anos, e pagam R$ 20,30 por mês por um barraco que dividem com mais quatro pessoas. A imigração é facilitada pela coincidência de grupos étnicos nos países da região. Latifa é iorubá, um dos mais importantes entre os 250 grupos étnicos da Nigéria.

Os imigrantes vão chamando e acolhendo parentes e amigos da terra natal. Um funcionário do governo estadual que comandou um minicenso em 2006 observou que as fichas dos pesquisadores eram pequenas demais para registrar todos os moradores de cada casa – oito, dez pessoas. O governo do Estado de Lagos sustenta que a região metropolitana tem 18 milhões de habitantes. O governo federal, que distribui recursos com base na população, fala em 10 milhões. O próprio funcionário disse ao Estado que o número correto é em torno de 15 milhões. O urbanista Olugbenga Akinmoladun, da Universidade de Lagos, concorda com a estimativa.

A população de Lagos cresce 8% ao ano – o dobro da média nacional. Apesar de ter perdido o status de capital para Abuja em 1991, ela está para a Nigéria assim como São Paulo e Rio estariam para o Brasil se fossem uma só cidade. Com 36,8% da população urbana da Nigéria, Lagos tem sido um ímã desde o boom do petróleo dos anos 1970. Sua área de 3.345 quilômetros quadrados representa 0,4% do país, mas a população equivale a mais de 10%.

Em 1963, Lagos tinha 665 mil habitantes. Em 1975, no calor da crise do petróleo, o número saltara para 3,5 milhões. O destino de boa parte dos novos moradores tem sido as favelas: o número subiu de 42, em 1984, para mais de 100.

Das 25 megacidades do mundo, Lagos tem o mais baixo padrão de vida. Mas a cidade não atrai apenas pobres. Com a intensificação de seqüestros pela guerrilha do Delta do Níger, onde se concentra a exploração de petróleo, executivos estrangeiros se transferiram de Port Harcourt, a principal cidade da região, para Lagos, causando inflação brutal nos aluguéis dos apartamentos.

Em Ikoyi, onde se concentram os edifícios de alto padrão, um apartamento de um quarto sem mobília não é alugado por menos de R$ 129 mil ao ano. Os proprietários exigem pagamento adiantado de dois anos. Um executivo conta que optou por morar em Abuja, onde pagou adiantado R$ 46,7 mil por um ano num apartamento mobiliado. Prefere gastar R$ 402 em passagens aéreas sempre que precisa ir a Lagos.

Tanto quanto são atraentes para os vendedores ambulantes, as ruas de Lagos podem representar um castigo para os lojistas que tentam manter negócios razoavelmente formais, em pontos comerciais. “Aqui estamos passando fome”, diz Anayo Henry Okeike, dono de uma loja de produtos para panificação na Rua Igbehn-Adun, na favela Makoko.

A rua de terra repleta de poças d’água e lama é intransitável de carro. Até os pedestres a percorrem com dificuldade, equilibrando-se sobre tábuas de madeira. Não há rede de esgoto em Lagos, e entre a fileira de lojas e casas e a rua, um canal fétido – que Okeike atravessa com uma pinguela de tábua – denuncia a contaminação da água pelas fossas negras. Nessas condições, os fregueses desaparecem na estação chuvosa, que cobre metade do ano (de abril a outubro). “Não acredito mais no comércio”, desiste Wisdom Duru, de 23 anos, em sua loja de motores de popa. Compositor de rap, ele sonha em gravar um CD.

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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