Cuba terá festa discreta no 50º aniversário da Revolução

Preparativos das comemorações são marcados por filas para comprar carne e para obter cidadania espanhola

HAVANA – Fustigados pelas dificuldades econômicas, agravadas pela passagem de três furacões este ano, os cubanos se preparam sobriamente para as celebrações do ano novo e do 50º aniversário da Revolução Socialista. As duas maiores são o aparecimento de carne bovina nos açougues estatais e a concessão de nacionalidade espanhola aos filhos e netos de exilados da ditadura franquista e da Guerra Civil.

O governo argentino fez a Cuba uma doação de carne, que foi moída e distribuída aos açougues. Como todos os outros produtos subsidiados nos armazéns estatais, a venda da carne é marcada na caderneta da família. Cada pessoa tem direito a meio quilo, que custa 5,25 pesos (US$ 0,26). De acordo com os cubanos, há pelo menos duas décadas não se via carne de vaca nos açougues estatais. Tradicionalmente, os cubanos comem pernil na ceia de fim de ano. Mas aqueles que ainda não tinham comprado sua cota de carne bovina faziam filas ontem nos açougues.

“Ninguém sabe quando vai ter carne de novo”, disse o funcionário de um açougue em Havana Velha.

A durabilidade da carne é ameaçada por outro fator. Segundo estimou o açougueiro, em 60% dos açougues a câmara de refrigeração não funciona. O governo não dá manutenção nas câmaras. O açougueiro disse que ele mesmo consertou a do açougue em que trabalha, da marca americana Fresco, anterior à Revolução. Para poupá-la, ele a mantém ligada apenas das 13h às 16h, quando o calor aperta, e durante a noite. Nos supermercados estatais de moeda forte, 1 quilo de carne é vendido a proibitivos 9,50 CUCs, ou US$ 11,87.

Muito maior que a dos açougues foi a fila que se formou em frente ao Consulado da Espanha em Havana, depois da aprovação da Lei de Memória. O Ministério das Relações Exteriores da Espanha estima que 100 mil cubanos tenham direito à nacionalidade espanhola, por essa nova lei. Cerca de 3 milhões de cubanos vivem no exterior, e são a principal fonte de divisas do país.

Com exceção dessas pequenas alegrias, as celebrações são marcadas pelo tom circunspecto do discurso do presidente Raúl Castro no encerramento dos trabalhos do Parlamento, no sábado. Raúl, que dirige o país desde julho de 2006 – quando seu irmão, Fidel, ficou doente -, e que foi formalizado no cargo em fevereiro, anunciou mais rigor no cumprimento das leis. “Deve ficar claro que não haverá retrocessos no propósito de fortalecer a institucionalidade, a disciplina e a ordem em todas as esferas do país”, avisou Raúl.

Os cubanos comuns interpretam a mensagem prevendo mais repressão à economia informal, que irriga os orçamentos domésticos com CUCs, a moeda forte, que equivale a US$ 1,25 e a 25 pesos. Só com CUCs podem comprar os produtos que não encontram nos armazéns estatais de moeda nacional, incluindo roupas, tênis, artigos de higiene, a própria carne e outros alimentos de qualidade. Raúl anunciou ainda a eliminação dos estímulos dados aos trabalhadores em moeda forte – entre 10 e 20 CUCs (US$ 8 e US$ 16) que alguns deles recebem, além dos salários, que giram entre 200 e 600 pesos (US$ 10 e US$ 30).

Por causa dos prejuízos causados pelo furacão, de US$ 10 bilhões, ou 20% do PIB cubano, não haverá desfile militar nem festa para lembrar o aniversário da Revolução. A data será lembrada com um discurso de Raúl, no dia 1º, em Santiago de Cuba, no leste da ilha, na sacada da prefeitura da cidade, de onde seu irmão Fidel anunciou a vitória da Revolução, em 1959.

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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