‘Só aceito ser julgado por juízes imparciais’

Da embaixada do Brasil, presidente deposto diz ao ‘Estado’ que, até agora, não houve avanço no diálogo com golpistas

TEGUCIGALPA – O presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, disse ontem que só aceita submeter-se a julgamento por juízes “imparciais”, e não por aqueles vinculados ao governo de facto e aos militares que o respaldam. Em entrevista ao Estado, pelo telefone, Zelaya disse que a forma de nomeação desses juízes seria “parte do acordo” para uma saída negociada à crise deflagrada por sua destituição, dia 29 de junho. Zelaya foi acusado de violar a Constituição, ao tentar realizar uma consulta popular sobre a convocação de uma Assembleia Constituinte.

O presidente deposto, abrigado na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa há quase duas semanas, deixou claro que não houve nenhum avanço nas negociações, e descartou a possibilidade de abrir mão da presidência. “Há coisas que não se podem negociar”, disse Zelaya. O presidente de facto, Roberto Micheletti, ofereceu na quinta-feira renunciar ao poder se Zelaya aceitasse submeter-se à Justiça e entregar o poder a um conselho de ministros até a realização das eleições, em 29 de novembro.

O sr. se preocupa com sua segurança na embaixada? 

Eles garantiram que não vão invadir a embaixada. Entretanto, sempre há um perigo.

O sr. mandou cobrir as janelas com folhas de alumínio? 

Para poder falar ao telefone, porque estão interferindo com um bombardeio eletrônico em todas as ligações, e nos afeta também a saúde.

Roberto Micheletti disse que se o sr. aceitar ser julgado e entregar o poder a um conselho de ministros, ele também aceita deixar o poder. Como vê essa oferta? 

Na democracia hondurenha, o soberano é o povo. Aqui, não há reis nem monarcas nem regime militar. As ofertas dele são para seguir violando a Constituição. Eu nunca fugi da Justiça. Sou inocente. Por isso voltei. Se tivesse medo da Justiça, não teria voltado. Agora, eu me submeto a uma Justiça com juízes imparciais. Mas os juízes de Micheletti e dos militares não são imparciais.

Então o sr. não aceitaria submeter-se à atual Corte Suprema de Justiça? 

Vou repetir a resposta: eu me submeto à Justiça a qualquer momento com juízes imparciais.

Mas há juízes imparciais em Honduras? 

Podem ser nomeados.

E quem deveria nomeá-los? 

Bom, isso é parte do acordo.

Mas o sr. aceitaria não voltar à presidência?

(Solta uma gargalhada) Há coisas que não se podem negociar. E uma delas é a substituição da soberania popular. Isso não se pode negociar.

Como já estamos muito perto das eleições, para sair do impasse, não se poderia aceitar um governo interino até as eleições? 

Isso seria outro golpe de Estado – frente a um golpe, outro golpe. Nós queremos restituir a democracia, não destruí-la.

O sr. acredita que a OEA é suficiente para a mediação, ou seria necessário também incluir a Igreja e a sociedade civil? 

Eu creio que o diálogo é a saída, mas o regime não me deixa fazê-lo porque não me permite visitas. Mas um diálogo com respaldo e vigilância internacionais.

O senhor tem falado com o Departamento de Estado americano? Que sinais tem recebido? 

Os Estados Unidos e toda a América Latina, Brasil e todos os países estão firmes na restituição do sistema democrático. Tenho falado com todos. Estão firmes.

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

Deixe o seu comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

*