Americanos tentam restaurar confiança nas eleições

Apesar de investimento bilionário, sistema de votação ainda enfrenta problemas

PALM BEACH – São 13h30 em Palm Beach, Flórida. Chuva e sol se alternam. Priscila Borsay entrou na fila às 11h. Ainda lhe falta pelo menos uma hora e meia para chegar à cabine de votação. Oficialmente, o último dia de votação antecipada encerra-se às 14h. Como Priscila, 452 pessoas esperam na fila para votar. Em sua cadeira de rodas elétrica, Priscila, que sofre de distrofia muscular, e na véspera passou o dia no hospital depois de comer um feijão com arroz enlatado que lhe causou intoxicação alimentar, agüenta firme. Ela nem sabe em quem vai votar: “Quero um presidente que se preocupe com os deficientes. Vou decidir quando estiver na cabine.”

Numa eleição que bateu o recorde histórico de voto antecipado, Priscila simboliza o desejo de muitos americanos de exercer o direito do voto, independentemente de seu candidato. Em Palm Beach, o ímpeto é ainda mais notável: a cidade, 120 km ao norte de Miami, foi o epicentro do terremoto eleitoral de 2000, com suas cédulas de cartão perfurado que confundiram os eleitores.

Depois de duas recontagens e uma decisão de 5 a 4 na Corte Suprema, o republicano George W. Bush venceu o democrata Al Gore por escassos 537 votos no Estado, abrindo caminho para sua vitória no Colégio Eleitoral.

Num sinal da importância da Flórida, tanto McCain quanto Obama fazem campanha hoje no Estado, na véspera da eleição. Sarah Palin, vice de McCain, e a senadora democrata Hillary Clinton fizeram campanha no Estado no sábado.

Depois de oito anos e de US$ 3 bilhões de investimentos na reforma do sistema de votação no país todo, ele ainda gera problemas. Em agosto, uma eleição para juiz do condado de Palm Beach foi tumultuada pelo sumiço de cerca de 3.500 cédulas, quando a diferença entre os dois candidatos era de apenas 60 votos. As cédulas acabaram sendo encontradas.

Palm Beach está no terceiro sistema de votação. As perfuradoras de cartões deram lugar a computadores que geraram enormes desconfianças na eleição presidencial de 2004 – também vencida por Bush – porque não imprimiam comprovantes em caso de falha do sistema e necessidade de recontagem. Agora, as cédulas de papel estão de volta. Os eleitores devem ligar com uma caneta as duas extremidades de uma flecha que aponta para o seu candidato. As cédulas são depois escaneadas por computadores.

“Não creio que haverá problemas, porque está mais bem organizado desta vez”, avaliou o advogado Ben Greenberg, parte da força-tarefa de 5 mil advogados e estudantes de direito na Flórida (450 só no Condado de Palm Beach) que fiscalizam a votação para o Partido Democrata. Os republicanos têm um décimo de advogados.

“Esse sistema é mais fácil”, elogiou Susan Eshbach, de 54 anos, que entrou na fila às 8h30 e votou às 12h30. Pela lei na Flórida, a votação antecipada só pode realizar-se em cartórios eleitorais. “Tive que enfrentar a fila hoje, porque na terça-feira eu trabalho”, explicou Susan, dona de um restaurante, No dia da eleição, terça-feira, haverá seções também em colégios e igrejas, potencialmente reduzindo as filas. Susan votou em Barack Obama: “Precisamos de mudança. John McCain não dá conta, e não suporto Sarah Palin. Ela devia ficar em casa cuidando da casa e dos filhos.”

“Não temos escolha”, resigna-se Kate Tannock, de 46 anos. “Acreditando ou não no sistema, é o único que temos”, completou Kate, que na terça-feira tem aula num curso de auxiliar médica. “Votei em McCain e Palin porque são contra o aborto.”

“Estou restaurando minha fé no sistema, que foi abalada em 2000”, disse Kenneth Powell, um negro de 50 anos, dono de uma empresa de limpeza com seis funcionários. “Por isso estou aqui. Vou votar em Obama, porque ele vai diminuir os impostos para a classe média.”

Em geral, os eleitores republicanos são mais otimistas quanto ao sistema. É o caso de José Díaz, um cubano de 47 anos, há 27 nos EUA, dono de uma pequena empresa de jardinagem. “Pode haver problemas, mas eles vão sendo corrigidos”, disse Díaz. “O importante é que aqui se pode votar livremente, ao contrário de Cuba.”

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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