No Estado que pode desempenhar papel crucial, Obama e McCain trocam acusações
TAMPA – Na véspera da eleição, Barack Obama e John McCain vieram brigar pelos votos na Flórida, confirmando o papel crucial que esse Estado deve desempenhar mais uma vez na escolha do presidente dos Estados Unidos. A 180 km um do outro, Obama e McCain disputaram quem vai baixar mais os impostos, resolver a crise econômica e garantir a segurança do país, e trocaram acusações citando frases dos adversários fora de contexto.
Depois de 22 meses de campanha, Obama escolheu fazer um de seus últimos comícios em Jacksonville, 520 km ao norte de Miami, para capitalizar sobre uma declaração de McCain. “John McCain simplesmente não entende”, disse Obama, na Arena Memorial dos Veteranos, que tem capacidade para 15 mil pessoas e estava lotada. “Lembram o que ele disse quando estava aqui em Jacksonville em 15 de setembro? ‘Os fundamentos de nossa economia são fortes.’ Naquele dia, mais de 5 mil empregos se perderam e mais de 7 mil famílias foram despejadas de suas casas.”
Obama não citou o restante da frase de McCain: “Esses são tempos muito difíceis. Prometo que nunca colocaremos a América nessa posição de novo.” A multidão vaiou McCain e Obama, preocupado com o comparecimento de seus eleitores, pediu: “Vocês não têm que vaiar, só têm que votar.” Ele reafirmou a promessa de reduzir os impostos de 95% dos contribuintes, incluindo “99,9% dos encanadores”, numa referência a Joe, o Encanador, que ficou famoso depois de fazer uma pergunta a Obama em Toledo, Ohio, no dia 12, sobre sua proposta em relação aos impostos. O candidato respondeu dizendo que era preciso “distribuir a riqueza”, um conceito rejeitado por muitos americanos e desde então muito explorado pelos republicanos.
“O senador Obama quer ser redistribuidor-em-chefe”, zombou ontem McCain no seu comício do lado de fora do Estádio Raymond James, em Tampa, 340 km ao norte de Miami. “Eu quero ser comandante-em-chefe.” McCain continuou: “Ele está concorrendo para distribuir a riqueza; eu, para criar mais riqueza. Ele quer punir os bem-sucedidos; eu quero tornar todo mundo bem-sucedido”, completou McCain, cuja mulher, Cindy, é a milionária herdeira de um império de distribuição de cervejas no Arizona. “Ele acha que os impostos estão muito baixos. Eu acho que os gastos estão muito altos.”
McCain respondeu às tentativas dos democratas de o associarem ao presidente George W. Bush, que sofre uma taxa de reprovação recorde, de mais de 70%. “Não sou George Bush”, disse ele sobre o colega de partido. “Se o senador Obama queria concorrer com ele, deveria ter-se candidatado há quatro anos.” A multidão gritava “Nobama” e “USA”. Dentre os 1.381 presentes (segundo um policial que registrava numa máquina de contagem cada um que passava), havia apenas quatro negros, e muito poucos hispânicos. Atrás em todas as pesquisas, o candidato republicano avisou, ao lado do popular governador da Flórida, Charlie Crist: “Os analistas e os democratas podem não saber, mas ‘the Mac is back’ (McCain está de volta).”
Tanto McCain quanto Obama vieram cortejar os votos dos 7% de indecisos da Flórida, que podem consolidar a vitória democrata ou promover uma virada republicana. Mas os que foram ouvir McCain em Tampa já chegaram decididos. “McCain tem um histórico comprovado”, disse Joy Campa, de 52 anos, gerente de marketing de uma empresa. “Obama é um mentiroso. Não se pode confiar nele. Ele disse uma vez que, entre lutar pela América e pelo Islã, lutará pelo Islã”, afirmou Joy, repetindo uma das acusações infundadas contra Obama.
“McCain não vai tolerar as pessoas que apóiam o terrorismo”, disse Leslie Zsumlic, professora aposentada. “Se Obama vencer, o país vai ficar nas mãos dos democratas”, acrescentou a massagista Patrícia Zalatan. “Como ex-piloto, McCain é capaz de tomar decisões rápidas”, elogiou Edward Moore, de 64 anos, veterano da Força Aérea no Vietnã. “Apóio McCain porque não acredito em casamento gay e aborto”, explicou Chris Holbrooke, de 43 anos, que tem uma empresa de construção. “Não levo em conta a questão dos impostos. Qualquer um que se eleger vai ter que aumentá-los, com a situação em que está o país.”
Em meio ao ritmo frenético da campanha, Obama cometeu uma gafe em Jacksonville. Ele se queixou da propaganda negativa de McCain contra ele “aqui em Ohio”. Quando a multidão o lembrou de que estava na Flórida, Obama admitiu: “Tenho viajado demais.” Além da Flórida, Obama esteve ontem na Carolina do Norte e na Virgínia. Nada comparável com a jornada de McCain, que fez um comício em Miami à meia-noite de domingo e outro em Tampa às 9h30, e planejava percorrer ontem sete Estados, todos eles sob disputa acirrada.
Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.