Equipes do atual e do futuro presidente do México se reúnem, enquanto a oposição radicaliza manifestações
CIDADE DO MÉXICO –O fosso que divide os dois Méxicos se alargou ontem. O presidente eleito Felipe Calderón se reuniu com o presidente Vicente Fox, para dar início a uma longa transição até sua posse, no dia 1.º de dezembro. Enquanto isso, os partidários do candidato derrotado na eleição de 2 de julho, Andrés Manuel López Obrador, avançavam nos prepativos para a sua Convenção Nacional Democrática. Marcada para o dia 16, ela deverá lançar um governo e uma assembléia constituinte paralelos.
Depois da reunião com o candidato vencedor do seu Partido da Ação Nacional (PAN), Fox anunciou que equipes do governo e de Calderón formarão grupos de trabalho com tarefas como a de elaborar em conjunto a lei orçamentária para 2007. Na noite de terça-feira, depois da rejeição, pelo Tribunal Federal Eleitoral, do pedido de anulação da eleição, Calderón – que venceu por apenas 0,56% dos votos – propôs diálogo à oposição: “Aos líderes políticos e sociais, digo que em mim encontrarão a total disposição de resolver as discrepâncias que nos separam.”
Anúncio publicado ontem nos jornais mexicanos, assinado pelos quatro principais bispos da Igreja católica, trazia um apelo semelhante: “É hora de estender as pontes do diálogo, dos entendimentos e dos acordos imprescindíveis para possibilitar a governabilidade e construírmos um México mais justo.” Num país profundamente católico, nem a Igreja ficou a salvo da polarização no México. A Catedral Metropolitana foi invadida, durante missas dominicais, por militantes em vigília no centro histórico da Cidade do México, acusando a cúpula da igreja de estar do lado de Calderón.
“Nunca vou me dobrar diante dos classistas, fascistas que hipocritamente aparentavam ser gente de boa vontade”, descartou López Obrador, no início da noite de terça-feira, em seu discurso diário aos simpatizantes, na Praça da Constituição (ou Zócalo), em frente ao palácio do governo. A tensão aumenta conforme se aproxima 16 de setembro, o Dia da Independência do México. Nessa data tradicionalmente se realiza a parada militar que desce justamente a Avenida Reforma rumo à Praça Zócalo, o território ocupado pelos manifestantes pró-López Obrador. Precisamente nesse dia, a oposição pretende realizar a sua convenção.
Se as barracas ao longo de cerca de dez quilômetros da Avenida Reforma tiverem de ser desmanteladas e os centenas de manifestantes, retirados à força, a tarefa deve caber ao Exército, já que a polícia metropolitana, em princípio encarregada da ordem pública, está subordinada ao Distrito Federal, controlado pelo Partido Revolucionário Democrático, de López Obrador, que deixou o governo da capital para concorrer à presidência.
“Se vierem nos bater, saímos”, dizia ontem a vendedora ambulante María Esther Flores Rubio, 45 anos, com um olhar cansado depois de mais de um mês dormindo numa barraca da Assembléia de Bairros. Se todos reagirão com a mesma resignação, é difícil prever.
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