Maioria dos casos é de serviços não prestados

Ministério Público vê licitações fictícias e notas justo abaixo do valor mínimo previsto por lei

  

LONDRINA – A linha de investigações do Ministério Público em Londrina sugere que o suposto esquema de desvio de dinheiro público age tanto no atacado como no varejo. Monta licitações fictícias, para justificar gastos acima de R$ 150 mil, que, segundo a Lei de Licitações, só podem ser feitos mediante licitação; e simula concorrências por carta-convite, modalidade requerida para despesas acima de R$ 8 mil. Não por acaso a promotoria recebeu uma profusão de contratos por carta-convite pouco abaixo dos R$ 150 mil e de notas fiscais de pouco menos de R$ 8 mil.

Os contratos até agora examinados pelo Ministério Público, firmados entre a prefeitura de Londrina e cerca de 40 empresas, referem-se a serviços que não teriam sido efetivamente prestados. A maioria das empresas existe, mas não está sequer cadastrada para participar de concorrências em Londrina; outras teriam sido criadas especialmente para fornecer papéis necessários para justificar os gastos.

“Eles dizem: ‘hoje precisamos levantar R$ 300 mil’”, exemplifica uma fonte ligada às investigações. “Emitem um cheque nesse valor no nome de uma empresa, chamam o representante dela, pedem a documentação e depois montam o processo de licitação.” Os papéis, embora preparados depois, servem para justificar os gastos. “Se o Tribunal de Contas examina a documentação, não acha nada, pois está tudo em ordem”, explica a fonte.

De acordo com o ex-diretor da Comurb Eduardo Alonso de Oliveira, que colabora com as investigações, o dinheiro, nos casos de serviços não prestados, é repartido da seguinte forma: 70% para o “esquema do prefeito”, 25% para a empresa e 5% para a pessoa encarregada de montar o processo. Ao receber o pagamento total, a empresa é instruída sobre as contas em que deve depositar os 75%. Os serviços efetivamente realizados são superfaturados, em média, em 25%, que são devolvidos às contas do esquema.

Segundo Alonso, a exceção é o serviço de coleta de lixo prestado pela Vega Engenharia Ambiental – é devolvida metade do dinheiro. “Esse era considerado o contrato-modelo pelo (ex-secretário de Governo de Londrina) Gino Azzolini Neto”, diz. “Esse nível de superfaturamento só é possível porque a prefeitura não fiscaliza a coleta do lixo, acatando as planilhas da empresa.” Haroldo Olivati, gerente da Vega em Londrina, e Alexandre Barreto Melo, encarregado administrativo, não quiseram falar ao Estado.

Forma da lei – Ao negar seu envolvimento no esquema, Azzolini, que é advogado em Londrina, disse que assinou os documentos com a ressalva de que fossem cumpridas as determinações legais. “Quando eu assinava, estava dito: autorizo na forma da lei.” Além disso, ele afirma que, até onde sabe, os processos sob investigação seriam posteriores a seu período na prefeitura.

Azzolini parou de assinar documentos em outubro de 1998 e deixou o cargo no início de 1999. Parte do desvio teria ocorrido antes de outubro de 1998, segundo fontes ligadas às investigações. Na gestão de Azzolini foi contratada a empresa Esteio, de Curitiba, para um serviço de aerofotometria orçado em mais de R$ 8 milhões. Denúncia de fraude motivou o cancelamento da licitação. A linha de investigação sugere que a Esteio também participava do esquema.

Segundo depoimentos e documentos de posse da promotoria, o representante da Esteio nos contratos era Arion Cruz Santos. O Estado não conseguiu localizá-lo. O gerente de Recursos Humanos, Adolfo Schessler, disse que Santos já não representa a empresa há mais de dois anos e não se sabe seu paradeiro.

O sucessor de Azzolini, Wilson Mandelli, secretário entre janeiro e julho de 1999, é investigado como tendo dado continuidade ao esquema. Ele também disse que autorizava a abertura de processos licitatórios seguindo a lei. “Sempre trabalhei dentro do princípio da legalidade e nunca extrapolei poderes”, acrescentou Mandelli, que tem escritório de engenharia em Londrina. Cassemiro Zavierucha, ex-conselheiro da Comurb e apontado por Alonso e outros depoentes como o principal operador do esquema, não quis falar ao Estado.


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