Pesquisadores do BNDES defendem vinculação direta entre benefício e contribuição
Uma conta individual, com extratos periódicos, para todos os segurados da Previdência acompanharem a evolução da capitalização de suas contribuições e a expectativa de benefício futuro. A assistência social com orçamento próprio, custeado pelos impostos, e não mais mesclado ao da Previdência. A manutenção dos compromissos a que o Estado está obrigado, por lei. E a entrada futura e gradual da iniciativa privada.
Esses são os fundamentos da proposta de técnicos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para a Previdência no Brasil, exposta num capítulo do livro A Economia Brasileira nos Anos 90, lançado recentemente pela instituição. O objetivo é criar um sistema equânime, com “benefícios e contribuições vinculados estreitamente”, que, ao mesmo tempo, conduza ao equilíbrio atuarial e possa ser edificado sobre leis aprovadas por maioria simples, sem necessitar de demoradas emendas à Constituição nem de penosas batalhas no Supremo Tribunal Federal sobre direito adquirido.
Os pesquisadores concluíram que, pelas garantias mantidas na Constituição de benefícios equivalentes a salários integrais para o funcionalismo público, é conveniente manter a separação entre o Regime Geral da Previdência Social (RGPS), que atende os trabalhadores da iniciativa privada, e o Regime Jurídico Único (RJU), dos servidores.
O RGPS passaria a ser regime de contribuição definida e obrigatória até um teto, como o atual, de R$ 1.255. Teria “capitalização escritural individual”, ou seja, seria uma conta pessoal – administrada, porém, pelo Estado. O capital acumulado na conta individual seria a soma das contribuições mensais multiplicada por uma taxa de capitalização. Os autores citam como referência o índice de 3% ao ano, usado como rendimento de longo prazo para o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).
A contribuição individual sairia exclusivamente do salário dos trabalhadores, com exceção daqueles sob condições insalubres, que teriam alíquota especial paga pelas empresas. Hoje, a alíquota do empregado vai de 7,65% a 11%, dependendo da faixa salarial, até o teto de R$ 1.255. O empregador paga de 21% a 23% sobre o salário integral. Para compensar a transferência do desconto para o empregado, todos os segurados do RGPS teriam aumento salarial de 20%, até o teto de contribuição, de modo que a mudança de regras não alterasse o salário líquido do trabalhador.
A parcela da atual contribuição do empregador que exceda a faixa de 1.255 continuaria sendo recolhida e canalizada para custear o atual sistema. Essa “contribuição solidária” poderia ser reduzida conforme o déficit previdenciário diminuísse. O teto de contribuição – e de benefício – se manteria por um tempo, porque, se fosse reduzido imediatamente, o governo não teria recursos para arcar com a diminuição da receita. Entretanto, esse teto seria gradualmente reduzido ao longo dos anos seguintes, até chegar a 30% do patamar inicial.
O custo administrativo da Previdência e o seguro para as chamadas “contingências não-programadas” – pensões por morte e invalidez e auxílios em caso de doença, prisão e maternidade – seriam deduzidos das contribuições mensais. O seguro de acidentes de trabalho continuaria sendo pago compulsoriamente pelas empresas, na alíquota de 2% sobre a folha salarial.
Por força da atual legislação, que vincula os benefícios dos inativos aos salários dos ativos, o RJU teria de seguir sendo regime de benefício definido. Nesse caso, para garantir a equivalência entre contribuições e benefícios, seriam usadas “alíquotas equânimes”, como aquelas definidas no estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), mostrado na reportagem de ontem.
A União participaria da contribuição de cada servidor até o teto, como fazem hoje os empregadores no RGPS. Acima do teto, caberia ao servidor arcar integralmente com a alíquota equânime. A qualquer instante, o segurado dos dois regimes teria direito de modificar sua data de aposentadoria, sendo refeitos os cálculos atuariais que garantiriam o equilíbrio entre contribuições e benefícios.
O déficit de R$ 45 bilhões ao ano impede atualmente a redução da participação do Estado e o sistema teria de se manter exclusivamente público no curto prazo. Num cenário de melhora fiscal, os fundos privados poderiam entrar progressivamente, assumindo o espaço criado pela redução do teto de contribuição compulsória.
O Estado permaneceria presente, no entanto, como regulador e fiscalizador dos fundos privados e como controlador das contribuições referentes à parcela pública da Previdência. E os 7,9 milhões de brasileiros que recebem um salário mínimo por mês sem terem contribuído continuariam recebendo, mas na conta da assistência social, custeada pelos impostos.