Câmara é a “Constituição viva”

A Câmara dos Lordes é a instância máxima de decisão da Justiça britânica. O sistema é muito distinto do brasileiro, que segue a matriz romana.

Mas, se fosse para comparar as hierarquias de um e de outro Judiciários, a Câmara dos Lordes corresponderia ao Supremo Tribunal Federal, enquanto a Alta Corte de Justiça (High Court of Justice) equivaleria ao Superior Tribunal de Justiça brasileiro.

Como o Reino Unido não tem Constituição escrita, os lordes são vistos como uma espécie de Constituição viva. À falta da letra, seguem o espírito da lei, para interpretar a legislação ordinária. Na prática, não são todos os lordes que julgam as apelações das decisões da High Court. São os juízes da Suprema Corte do Judiciário, composta pela Corte de Apelações e pela Alta Corte de Justiça.

A Câmara dos Lordes tem mais de mil membros e é composta assim: os arcebispos da Cantuária e de York, dirigentes da Igreja Anglicana, e mais 24 bispos; todos os duques, marqueses, condes, viscondes e barões; outros membros não hereditários da corte, nomeados pela rainha, como a baronesa Thatcher, ex-primeira-ministra; e, finalmente, os juízes acima citados.

Essa função de corte de apelações é a que confere maior visibilidade à Câmara dos Lordes, encarada por muitos britânicos como órgão inútil de sustentação da nobreza. Como Câmara Alta do Parlamento britânico, a Câmara dos Lordes tem função sobretudo protelatória. A maioria dos projetos que não recebam a aprovação da Câmara dos Lordes se converte em lei depois de ter sido aprovada pelo Parlamento (como é genericamente designada a Câmara dos Comuns) em duas sessões consecutivas e desde que haja passado o período de um ano entre sua segunda apresentação na primeira sessão e sua terceira leitura na segunda sessão. Os projetos para aumento de impostos aprovados pela Câmara dos Comuns se tornam lei um mês depois de terem sido enviados à Câmara dos Lordes – com ou sem a sua aprovação.

Entretanto, a Câmara dos Lordes não tem função apenas protelatória, no campo parlamentar. Ela revisa os projetos cuja formulação não tenha sido suficientemente detalhada na Câmara dos Comuns. Também realiza a primeira apreciação de projetos considerados não controvertidos pelos líderes partidários. Depois dessa apreciação, com um debate sumário pelos deputados, ele pode ser aprovado na Câmara dos Comuns. É o equivalente, no Brasil, à aprovação por consenso pelas comissões e pelos líderes, sem ir a plenário.

Além disso, os defensores da manutenção da Câmara dos Lordes argumentam que ela é o foro privilegiado para a realização de debates nacionais livres das amarras impostas – lá – pela disciplina partidária. De fato, os lordes procuram assumir posição apartidária, embora aqueles que tenham exercido o cargo de primeiro-ministro, como a conservadora Margaret Thatcher, tenham origem marcadamente partidária; sem contar que a avassaladora maioria dos lordes nutre simpatia pelos conservadores.

 

Em qualquer caso, o debate sobre a manutenção da monarquia na Grã-Bretanha – que de vez em quando vem à tona – tem sido alimentado pela conveniência ou não de manter a Câmara dos Lordes. Num regime republicano, ela daria lugar a um Senado eleito democraticamente.

Deixe o seu comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

*