Na sessão inaugural, arcebispo é nomeado presidente e seu objetivo é a renúncia de Mahuad
QUITO — As Forças Armadas equatorianas, instadas a apoiar o movimento pela destituição do presidente Jamil Mahuad, reafirmaram ontem seu compromisso com a institucionalidade. O ministro da Defesa, general José Gallardo, ladeado pelos comandantes das três Armas, reafirmou seu “apoio ao governo neste momento difícil”. O autodenominado “Parlamento Popular”, instituído na terça-feira, havia solicitado a adesão das Forças Armadas e da polícia, em sua tentativa de assumir “todos os poderes” no país.
A sessão inaugural do “Parlamento Nacional dos Povos do Equador”, que reúne organizações indígenas, sindicatos de trabalhadores, grupos de mulheres, entidades estudantis e até setores da Igreja Católica, foi aberta com um ritual xamânico de “purificação e bendição” dos cerca de 800 delegados. Foi eleito presidente do Parlamento, que organizará um governo paralelo, o arcebispo de Cuenca, monsenhor Alberto Luna Toba, e vice-presidente o líder máximo da Confederação Nacional dos Índios do Equador (Conaie), Antonio Vargas.
O arcebispo assegurou que sua ação está em consonância com o Evangelho, argumentando que “a política é a arte de dar ao bem comum a primazia sobre o bem particular”. E entregou a condução dos trabalhos a Vargas. “Estamos prontos para morrer se as Forças Armadas e a polícia se voltarem contra nós”, sentenciou Vargas, depois de pedir o apoio dos militares.
Os índios representam 40% da população equatoriana e os mestiços, outros 30%. O movimento é apoiado, também, por partidos de esquerda e por vários grupos de trabalhadores, sobretudo funcionários públicos, como médicos, que estão em greve.
Mas a capacidade de aglutinação do movimento só poderá ser medida no sábado, quando os organizadores pretendem reunir uma multidão em Quito, para, a partir daí, “parar o país”, até que o presidente renuncie. Ontem, primeiro dia de manifestação em Quito, o movimento reuniu pouca gente. Dezenas de pessoas conseguiram bloquear o trânsito por alguns minutos em ruas do centro da cidade, mas foram logo retiradas pela polícia, sem maior resistência.
O protesto mais significativo de ontem ocorreu em Cuenca. Centenas de manifestantes praticamente pararam o centro histórico da cidade e foram dispersos com bombas de gás lacrimogêneo.
Já Guayaquil, a maior cidade do país, está semiparalisada desde segunda-feira, depois do anúncio, no domingo, da dolarização da economia. Estão em greve os motoristas de ônibus urbanos, intermunicipais e interprovinciais, que, no Equador, são proprietários dos veículos que dirigem, assim como os taxistas.
Os chamados “transportistas” reivindicam cotação do dólar em 4 mil sucres para efeito de pagamento de suas dívidas, contraídas em moeda americana para fugir aos juros exorbitantes, na compra de veículos. O governo fixou o dólar em 25 mil sucres. Os pequenos comerciantes de Guayaquil, que trabalham em barracas, também fecharam as portas, exigindo que o governo reveja as medidas.
O Ministério da Educação ordenou o reinício das aulas, hoje, nas escolas particulares da Região Serrana, que inclui Quito. Nas escolas públicas, as aulas continuam suspensas, devido à insegurança causada pelos protestos de rua. Nas duas outras regiões, a Costeira, onde fica Guayaquil, e a Oriental, as autoridades locais podem decidir se retomam ou não as aulas tanto em escolas particulares quanto em públicas.