Chávez acusa oposição de tentar novo golpe

Convocados pelo governo, milhares de manifestantes fazem protesto contra boicote eleitoral

 

CARACAS

O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, acusou ontem à noite a oposição de tentar articular um novo golpe militar. “Tenho informações de que fizeram ligações a chefes militares”, disse Chávez, referindo-se genericamente a líderes oposicionistas e a empresários dos meios de comunicação. “Estou seguro de que os militares responderão com a mesma firmeza com que resistiram ao golpe militar, ao golpe petroleiro, ao golpe midiático e ao golpe eleitoral”, disse ele, numa menção a sua destituição em abril de 2002, à paralisação da indústria petrolífera em dezembro de 2003 e ao boicote às eleições de domingo.

Para Chávez, o boicote foi ordenado pelo presidente dos EUA, George Bush, em represália por sua atuação na última reunião de cúpula do hemisfério, há um mês, quando ele encabeçou a oposição às propostas americanas. “É o primeiro efeito da Cúpula de Mar del Plata”, disse ele, num evento de pagamento de diferenças retroativas de aposentadorias e pensões. “Nós, venezuelanos, nos tornamos uma pedra no sapato dos americanos”, observou Chávez, pedindo uma “mobilização permanente do povo em favor da soberania”. “No pasarán”, bradou Chávez, repetindo a frase da Revolução Cubana. “O imperialismo americano não passará.”

Atendendo a convocação do governo, milhares de pessoas participaram ontem em Caracas de uma manifestação em favor da realização das eleições parlamentares de domingo. Ostentando camisetas de órgãos da prefeitura e faixas que indicavam um ato previamente organizado e uma forte presença de funcionários públicos, os manifestantes caminharam até a sede do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), no centro da capital.

O vice-presidente José Vicente Rangel, que participou da “marcha”, estava efusivo. “É impressionante, convocamos há poucas horas, e o povo bolivariano compareceu maciçamente”, disse. “Com isso, sepultamos definitivamente o golpismo”, acrescentou ele, referindo-se ao boicote. 

Citando pesquisas que prevêem a eleição de 15 a 20 deputados oposicionistas, numa Assembléia Nacional de 167 cadeiras, Rangel garantiu que o problema da oposição não são as alegadas suspeitas de fraude no processo eleitoral: “Eles não têm votos, não têm povo. É impossível ir a eleições sem povo.” 

Na noite de quarta-feira, o partido Primeiro Justiça (PJ) aderiu ao boicote das eleições, tornando-se o terceiro a desistir da disputa, alegando riscos de fraude na contagem dos votos. “Não podemos solicitar o voto dos eleitores, se não seremos depois capazes de defendê-lo”, justificou Gerardo Blyde, secretário-geral do PJ, um partido novo, formado substancialmente por jovens. Para Blyde, a Venezuela está sob um “terremoto político”, que inviabiliza a realização de eleições.

O boicote foi lançado na terça-feira pela Ação Democrática (AD) e o Copei, os dois partidos de oposição mais tradicionais, alegando que o sigilo das urnas eletrônicas, fabricadas pela americana Smartmatic, pode ser violado. Durante os dois dias de discussões no PJ, um dos argumentos que mais pesaram em favor do boicote foi o fato de que os fiscais da AD eram responsáveis pela presença em 78% das seções eleitorais. Na sua ausência, a oposição ficará inteiramente desguarnecida.

Antes de anunciar o boicote, os partidos de oposição haviam imposto como condição para participar das eleições a desativação de um programa de computador que vincula a votação a um sistema de reconhecimento do eleitor via impressão digital, argumentando que ele violava o sigilo. Mesmo discordando do argumento, o CNE concordou em desativar o programa. A oposição continuou alegando que o sistema é capaz de armazenar a ordem dos votos, além de a contagem não ser inviolável. O CNE garantiu que essa ordem é embaralhada pelo programa, e que o sistema é à prova de fraudes. Mesmo assim, a oposição optou pelo boicote, exigindo o adiamento do pleito.

 

Enquanto os manifestantes pró-eleição se aglomeravam em frente ao CNE, o presidente do órgão, Jorge Rodríguez, fez um veemente apelo em favor das eleições e um duro ataque aos oposicionistas. “Aqueles que têm os meios, insultam, mas e aqueles que não os têm?”, disse Rodríguez, referindo-se ao amplo espaço dado na imprensa às denúncias da oposição. “Milhões de venezuelanos querem votar e o CNE tem de defender esse direito.” Afirmando que apenas 78 dos 4.056 candidatos se haviam retirado oficialmente da disputa, Rodríguez perguntou: “Quem tem mais direito? Esses 78 ou o resto? Em última instância, milhões de venezuelanos crêem no voto para superar suas dificuldades.” 

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