Presidente venezuelano celebra vitória, que lhe dará a oportunidade de candidatar-se a vários mandatos consecutivos
CARACAS
O presidente Hugo Chávez saiu vitorioso no referendo sobre a reeleição ilimitada na Venezuela. Com 94,20% das urnas apuradas, o “sim” estava vencendo por 54,36%, enquanto o “não” tinha 45,63%, segundo o primeiro boletim do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), divulgado às 21h35 locais (23h05 em Brasília). A abstenção foi de 32,95%, considerada baixa para os padrões da Venezuela.
Logo depois do anúncio, Chávez começou a celebrar cantando o hino nacional diante de milhares de partidários, na sacada do Palácio Miraflores, sede do governo. “A partir de hoje, me consumirei a vida toda ao serviço do povo venezuelano”, disse o presidente, citando uma carta de São Paulo. Chávez anunciou que, com a aprovação da reeleição ilimitada, “começa o terceiro ciclo da revolução, entre 2009 e 2019”.
Chávez, cujo segundo mandato sob a Constituição de 1999 termina em 2013, lançou-se “pré-candidato” para a eleição de 2012, para o período de 2013 a 2019. “A partir de hoje, consagro-me inteiramente ao povo venezuelano”, enalteceu. “Hoje vocês escreveram meu destino político, que é igual ao meu destino de vida.” Ele reafirmou seu compromisso com o socialismo e prometeu transformar a Venezuela numa “potência”.
O presidente disse que a primeira mensagem de felicitações que recebeu foi a do líder cubano Fidel Castro. “Esta vitória é sua também, Fidel, e do povo cubano e dos povos da América Latina”, declarou Chávez.
Enquanto Chávez monopolizava as atenções em cadeia nacional, líderes oposicionistas se abraçavam, alguns chorando, na sede da campanha pelo “não” em Caracas. A maioria saiu sem dar declarações. “Nós aceitamos este resultado”, disse o líder estudantil David Smolansky. “Continuamos de pé. Temos um compromisso com a Venezuela.”
Na sua primeira tentativa de introduzir a reeleição ilimitada, em dezembro de 2007, Chávez foi derrotado por 50,71% a 49,29%. Ele declarou, no sábado, que perdeu o referendo de 2007 porque nos meses que o antecederam se dedicou muito mais à sua intermediação para a libertação de reféns da guerrilha colombiana do que à campanha pela reforma constitucional. “Dessa vez, me meti de cabeça nessa campanha.” Em seu estilo literário-filosófico, Chávez citou ontem o personagem Hamlet, de William Shakespeare: “Aqui, estamos jogando o ser ou não ser, um velho dilema”, disse o presidente. “Nós, bolivarianos, patriotas, temos um projeto que está devolvendo a essência à Venezuela, que lhe haviam tirado.”
Chávez repetiu que, com o referendo, a Venezuela está “criando uma nova doutrina constitucional” e assumindo a “vanguarda da América Latina”. Na sua visão, a limitação da eleição a um ou dois mandatos é uma imposição de fora: “Estamos rompendo paradigmas que nos impuseram como se fossem imutáveis. Estamos num processo revolucionário.”
Chávez foi saudado na porta da escola onde vota no bairro popular 23 de Enero por uma multidão febril que gritava: “O comandante não vai embora.” Em Caracas e noutras partes do país, praticamente só havia propaganda em favor do “sim”.
A votação transcorreu em clima tranquilo. Ao longo do dia, líderes da oposição e do movimento estudantil fizeram apelos para que os eleitores comparecessem às urnas. José Albornoz, secretário-geral do partido Pátria para Todos, contestou as insinuações de Chávez e de outros membros do governo, de que as pesquisas indicavam a vitória do “sim”. “As informações que temos são diferentes”, disse Albornoz. “O povo não é tonto. Reconheçam o resultado. Não inventem.” Já Andrés Velásquez, ex-governador do Estado Bolívar, afirmou que a oposição tinha “milhões de razões” para festejar.
Os líderes estudantis afirmaram ter mobilizado mais de 50 mil estudantes, entre secretários de mesas de votação e fiscais. Assim como os representantes do governo, os oposicionistas enfatizaram que o sistema de votação é confiável.
Essa é também a opinião dos observadores internacionais, entre eles o brasileiro Max Altman, membro da Secretaria de Relações Internacionais do PT, para quem o sistema venezuelano “é o mais blindado do mundo”. Mas a oposição se queixa do uso da máquina do Estado.