Três pesquisas de boca-de-urna indicaram a vitória do “sim” no referendo sobre a reforma constitucional realizado ontem na Venezuela. Até as 22h40 de ontem (0h40 de hoje em Brasília), não haviam saído resultados oficiais.
CARACAS
O presidente Hugo Chávez coleciona vitórias eleitorais desde que se elegeu presidente pela primeira vez, em 1998, mas dessa vez a margem foi bem menor, segundo as pesquisas. “A disputa está apertada”, reconheceu à noite o vice-presidente Jorge Rodríguez, que comandou a campanha em favor da reforma.
Segundo a PLM Consultores, a vitória foi de 54% a 46% dos votos; o Datanálisis computou 56% a 44% e o Instituto Venezuelano de Análises e Dados, 53% a 47%. Aparentemente em razão da disputa acirrada, o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) atrasou a divulgação dos resultados, que havia sido prevista para as 19h. A votação transcorreu em clima de tranqüilidade. A reforma constitucional foi proposta pelo presidente e pela Assembléia Nacional por ele dominada.
“O espírito da democracia se instala cada vez mais na Venezuela, uma democracia participativa e de protagonismo”, festejou Chávez, que com a aprovação da reforma poderá se candidatar à reeleição quantas vezes quiser e acumulará poderes sem precedentes (leia Oposição vai ao Supremo Tribunal contra reforma). “Nunca na Venezuela se tinha votado tanto quanto nesses dez anos de revolução democrática pacífica bolivariana”, prosseguiu, numa rápida entrevista coletiva, ao votar, às 13h, numa escola técnica no bairro 23 de Enero, área pobre de forte tradição esquerdista no oeste de Caracas.
No discurso de encerramento da campanha, na sexta-feira, Chávez afirmara que o “sim” no referendo seria um voto nele e o “não” um voto no presidente americano, George W. Bush. Na pergunta que os eleitores responderam, ficou explícito o patrocínio do popular presidente à reforma: “Você aprova o projeto de reforma constitucional com seus títulos, capítulos, disposições transitórias, derrogatória e final, apresentado em dois blocos e sancionado pela Assembléia Nacional com a participação do povo e com base na iniciativa do presidente Hugo Chávez?”
O presidente propôs a alteração de 33 artigos da Constituição e a Assembléia Nacional, de outros 36. Os eleitores votaram nos dois blocos separadamente. Na campanha, Chávez apresentou a reforma como um passo decisivo em sua “revolução socialista bolivariana”, incluindo a introdução de formas “comunais”, “sociais” e “coletivas” de propriedade. Para a oposição, a reforma mergulha o país numa “ditadura militarista e socialista”.
A adesão de muitos chavistas à reforma foi abalada pela legalização dos conselhos populares, que tiram poder dos sindicatos e de outras entidades representativas, e pela oposição do respeitado general Raúl Baduel, que liderou a recondução de Chávez ao poder na tentativa de golpe de 2002. Até a última semana, as pesquisas previam a vitória do “não”. Elas passaram a indicar empate técnico nos últimos dias, depois que Chávez se engajou intensamente na campanha.
Com a proibição de fazer campanha ontem, líderes do governo e da oposição passaram o dia dando declarações com mensagens subliminares em favor ou contra a reforma constitucional. “Hoje na Venezuela decidimos se vamos no caminho do socialismo ou da democracia”, definiu Leopoldo López, prefeito (equivalente a administrador regional) de Chacao, bairro de Caracas, e integrante do partido de oposição Um Novo Tempo.
“Este referendo é mais importante do que uma eleição presidencial”, enfatizou o governador do Estado de Zulia, Manuel Rosales, segundo colocado na disputa pela presidência em dezembro do ano passado. “A Venezuela está no meio de uma grande encruzilhada. Ou tomamos o caminho do conflito, da violência, ou da paz e do diálogo.”
“Jovens que querem viver em liberdade, que querem ter trabalho e educação, votem”, pediu Yon Goicoechea, o principal líder estudantil do país. “Hoje é o dia em que todos temos que mostrar a cara”, definiu Goicoechea, um estudante de direito de 23 anos alçado à condição de um dos principais líderes da oposição, no vácuo deixado pelos partidos tradicionais, desmoralizados por escândalos de corrupção antes da primeira eleição de Chávez, em 1998, e pelas sucessivas derrotas eleitorais, desde então.