Auditoria independente e simulação evitam risco de fraude
CARACAS
Num país fortemente polarizado, governo e oposição finalmente concordam em pelo menos uma coisa: o sistema de votação da Venezuela é confiável. Não é para menos. Depois do traumático referendo de 2004, quando listas de votação e denúncias de perseguições por parte do governo circularam pelo país, e das eleições parlamentares de 2005, das quais a oposição se retirou alegando que o sigilo do voto não estava garantido, o sistema foi submetido a uma bateria de testes e auditorias tão exaustiva que beirou a paranóia.
Batizado de Operação Erro Zero, o esquema de controle do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) envolveu 13 auditorias, com o acompanhamento de fiscais do Comando Zamora, que conduziu a campanha pelo “sim”, e do Bloco do Não. O voto é eletrônico, como no Brasil. Tanto o hardware quanto o software usados nas 33.939 máquinas de votação foram testados, assim como dos 11.929 aparelhos de reconhecimento das impressões digitais, usados na entrada das seções eleitorais.
Os testes incluíram várias simulações de votações, para confirmar se o voto dado nas máquinas era transmitido corretamente para o sistema central de contagem. Além de transmitir eletronicamente o voto, as máquinas imprimem atas de votação. Depois de fechadas as urnas, ontem à tarde, estava previsto um trabalho de conferência dos votos de 54% das máquinas. Amostras de todos os lotes da tinta indelével colocada no dedo dos eleitores, fabricada pela Universidade Central da Venezuela, também foram rigorosamente analisadas, no despacho e na chegada, depois de denúncias em eleições anteriores de que ela se apagava. Mesmo assim, essas denúncias se repetiram ontem.
O sistema embaralhou a ordem de votação e os aparelhos de leitura de impressão digital ficaram desconectados do sistema central, para desfazer o temor de violação do sigilo do voto. Nas eleições parlamentares de dezembro de 2005, mesmo depois de o CNE aceitar a sua exigência de excluir os leitores de impressões digitais, a oposição se retirou da disputa. Como resultado, a abstenção alcançou 75% e o governo ficou com todas as cadeiras da Assembléia Nacional.
“Parece-me, pelo que vimos, que o sistema funcionou bem”, disse ao Estado o deputado Aldo Rebelo (PC do B/SP), um dos 100 observadores de 33 países convidados pelo CNE. “Imaginei que seria mais demorado, mas votaram rapidamente”, observou Rebelo, que visitou dez seções eleitorais em Caracas. Além dele, vieram também o senador José Nery (PSOL-AC) e o deputado Nilson Mourão (PT-AC). O CNE descredenciou o ex-presidente boliviano Jorge Quiroga, depois que ele fez críticas ao órgão, dominado por chavistas. Quatro organizações não-governamentais venezuelanas monitoram a contagem, ao lado dos fiscais do governo e da oposição.
“O sistema eleitoral venezuelano é um dos mais modernos e transparentes do mundo”, celebrou ontem Chávez. A afirmação foi repetida ao longo do dia por ministros e outros funcionários do governo. Menos efusiva, a oposição exortou os eleitores não só a votar, mas também a acudir aos centros de votação depois do fechamento das urnas para “vigiar” o seu voto. “Não há nenhuma maneira de descobrir em quem você votou”, procurou tranqüilizar Delsa Solorzano, dirigente do partido Um Novo Tempo, de oposição.