Grupo espera que País reforce oposição à pauta de encontro previsto para setembro, em Cancún
PORTO ALEGRE – O especialista em comércio exterior Martin Khor, da Rede do Terceiro Mundo, exortou ontem o governo brasileiro a rejeitar os acordos sobre livre concorrência, abertura para investimentos e licitações governamentais que estão na pauta da reunião ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC), marcada para setembro em Cancún, no México.
“Temos uma esperança especial em relação ao Brasil”, disse Khor, durante a conferência “OMC, o caminho para Cancún”, no Fórum Social Mundial. “Até aqui, o Brasil apóia os três acordos. Esperamos que, com a mudança política, o Brasil se junte a outros países para impedir que esses acordos sejam fechados em Cancún.”
Na descrição do ativista, o acordo sobre concorrência impede os governos de beneficiar empresas locais, em todos os setores. “Se um governo tiver algum tipo de política, ou lei, como a de proteção ambiental, que afete as empresas, elas poderão exigir na Justiça indenizações por perdas de lucro.”
Da mesma maneira, pelo acordo sobre investimentos, nenhum governo poderá conceder incentivos a empresas locais, em detrimento de companhias estrangeiras, nem criar reservas para nenhum setor.
Finalmente, pelo acordo de “transparência nas licitações”, nenhum governo poderá dar preferência a empresas locais na concessão de contratos públicos. “Isso não é para injetar concorrência, mas para permitir que os grandes eliminem os pequenos”, denunciou Khor. “Nós ficaremos totalmente abertos para sermos dominados pelas transnacionais.”
“Inspiração” – Outro que disse depositar “grande esperança” no governo Lula é Stanley Gacek, da American Federation of Labor-Congress of Industrial Organizations (AFL-CIO). “Lula representa uma inspiração para todo o movimento trabalhista internacional, o fim das políticas neoliberais no continente”, disse Gacek, que é amigo do presidente.
A AFL-CIO, com 13 milhões de filiados, aprovou resolução em 2001 apoiando a autonomia para os países regularem os fluxos de capital especulativo; perdão da dívida dos países pobres; cumprimento do acordo para liberar as patentes de medicamentos; permitir a continuidade de preferências para empresas locais em licitações públicas; respeito aos padrões de proteção ambiental e direitos trabalhistas, mas sem que isso se converta em “alavanca protecionista”. “O acordo de transparência de licitações não tem nada a ver com liberalização do comércio e quase tudo a ver com os interesses das grandes corporações de solapar as empresas locais”, disse Gacek.
Falando português fluente, o sindicalista americano, casado com uma brasileira, também condenou os subsídios agrícolas. A AFL-CIO considera que os subsídios maciços às exportações e ao grande agronegócio distorcem e são injustos. Segundo Gacek, o último pacote do governo Bush não beneficia os pequenos agricultores.
O espanhol Paul Nicholson, da Via Campesina, à qual é filiado o Movimento dos Sem-Terra, defendeu a proteção dos pequenos agricultores europeus. “O problema principal do mundo não é o comércio, é a produção e o acesso aos alimentos”, disse. “Não produzimos para exportar.”
Segundo Nicholson, o que está em jogo é, de um lado, a “soberania alimentar”, ou o direito de produzir alimentos; de outro, o de importar alimentos baratos. Enquanto governos de países em desenvolvimento, como o Brasil, se esforçam para incluir a agricultura na pauta da OMC, buscando o fim dos subsídios e do protecionismo, a Via Campesina quer o contrário. “Estamos aqui para dizer à OMC: fora da agricultura.”