Economia preocupa eleitor, mas o que está em jogo hoje e amanhã é que tipo de cidadãos os italianos querem ser
ROMA – O líder da centro-direita, Silvio Berlusconi, e o da centro-esquerda, Walter Veltroni, travam hoje e amanhã, nas eleições gerais da Itália, uma batalha que vai além de propostas de governo. Os italianos estão preocupados com sua situação econômica, mas Berlusconi e Veltroni diferem muito pouco nesse campo. Ambos prometem menos impostos e mais gastos, uma equação que todos sabem que não fecha. O que está em jogo, aqui, é algo mais essencial: que tipo de país e que tipo de cidadãos a Itália e os italianos devem ser. No terreno subjetivo da identidade e dos valores, Berlusconi e Veltroni são a antítese um do outro.
Berlusconi, 71 anos, um self-made man dono da segunda fortuna da Itália (US$ 9,4 bilhões), personifica a malícia, a irreverência, o individualismo, a disposição de vencer praticamente a qualquer custo, o ceticismo em relação às instituições e, diriam os críticos, às leis. Embora tenha sido primeiro-ministro em dois períodos (1994 e 2001 a 2006), é o antipolítico, talvez a combinação improvável de Paulo Maluf e Silvio Santos.
Veltroni, de 52 anos, intelectual, jornalista e filho de jornalista, ex-membro do Partido Comunista, prefeito de Roma desde 2001, defende o fortalecimento do Estado e das instituições, o bem comum sobre o proveito individual e a “justiça social”.
De acordo com Renato Mannheimer, diretor do Instituto de Estudos da Opinião Pública, o eleitor típico de Berlusconi é “trabalhador autônomo, com grau de instrução médio ou médio-baixo, não muito jovem e residente mais ao Norte que ao Sul”. Já o de Veltroni “é, em grande parte, trabalhador com carteira assinada, tem grau de instrução muito mais elevado e reside mais ao Centro”.
Numa consolidação dos resultados das diferentes pesquisas, feita pelo especialista Chris Hanretty, da Universidade Européia de Florença, a frente de centro-direita O Povo da Liberdade, de Berlusconi, aparece com 44,7% das intenções de voto; e a aliança de centro-esquerda Partido Democrático (PD), de Veltroni, com 37,4%. Depois, com 6,9%, vem a Esquerda Arco-Íris, que inclui comunistas e verdes, e antes era aliada da centro-esquerda.
A candidatura de Veltroni é prejudicada por dois problemas herdados. A chamada Lei Financeira, aprovada em 2006 pelo ex-primeiro-ministro Romano Prodi, do mesmo partido de Veltroni, destinava-se a combater a evasão fiscal, calculada em 20%, mas foi identificada com aumento de impostos, e tornou-se profundamente popular. Prodi renunciou em janeiro, depois de perder uma exígua maioria no Senado. O outro problema é a crise da coleta de lixo em Nápoles, uma das cidades mais importantes da Itália, administrada também pela aliança de centro-esquerda.
Seja quem for o vencedor, no entanto, uma coisa é praticamente certa: seu governo não durará muito.
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