Zyuganov e instituto denunciam pressões sobre funcionários públicos e falsificações de atas em favor de Medvedev
MOSCOU – O candidato do Partido Comunista a presidente da Rússia, Gennady Zyuganov, denunciou sinais de fraude nas eleições de amanhã. A acusação coincide com prognóstico feito pelo instituto de pesquisas Levada Center, que chega a quantificar a porcentagem esperada de fraude, e com denúncias em várias partes do país de pressões sobre funcionários públicos e até mesmo sobre empregados de empresas privadas com contratos com o governo para votar no candidato do Kremlin, o vice-primeiro-ministro Dmitri Medvedev.
“Existem regiões onde a falsificação é total, como no Cáucaso, na República da Mordóvia (centro-oeste do país) e na região de Kuzbas (oeste da Sibéria), afirmou Zyuganov a jornalistas, na entrada do prédio da União dos Escritores, onde participaria de um evento do Partido Comunista, no início da tarde de ontem. “Nas eleições passadas (para o Parlamento, em dezembro), compareceram 99% dos eleitores e 98% votaram na Rússia Unida (partido do governo). Isso levantou muitas suspeitas, e abrimos cerca de 50 processos.”
“Se as eleições fossem justas, o segundo turno seria inevitável”, prosseguiu o líder comunista, que tem 11% das intenções de voto, segundo o Levada Center. Zyuganov disse que seu partido, que ficou oito décadas no poder na antiga União Soviética, tem 500 mil fiscais para tentar evitar fraudes amanhã. À pergunta sobre se os comunistas “partirão para a briga” se Medvedev se eleger no primeiro turno, Zyuganov, de 63 anos, em geral monocórdico e pouco carismático, assumiu um ar ainda mais circunspecto: “O país não está em condições de brigar. O quadro não é tão róseo quanto mostram na TV”, disse ele, enumerando que os 55 milhões de trabalhadores russos recebem salário médio de 5 mil rublos (US$ 138) e que a aposentadoria média é de 3.050 rublos (US$ 85).
Os partidos da chamada “oposição liberal”, que não inscreveram candidatos por considerar as eleições injustas, devem entregar hoje à Comissão Eleitoral manifesto firmado por 5 mil personalidades e cidadãos comuns recusando-se a “participar desta farsa”, informou a agência France Presse. Um dos sinais de eventual fraude, segundo a oposição, é a emissão de um número exagerado de cédulas para votação fora do domicílio eleitoral. Funcionários públicos, incluindo professores e médicos, também têm denunciado que seus chefes os têm advertido abertamente a votar no governo no domingo, assim como empregados de firmas contratadas pelo governo. Para atrair eleitores, haverá até a venda de ingressos para concertos para jovens e de alimentos com descontos em seções eleitorais, segundo a Associated Press.
Lev Gudkov, diretor do instituto independente Levada Center, disse ao Estado, com base na experiência de eleições anteriores, que a fraude deve oscilar entre 5% e 8% dos votos. “Não é nada que possa mudar os resultados”, garantiu Gudkov. De acordo com o Levada, 80% dos eleitores votarão em Medvedev, seguido de longe por Zyuganov, com 11%, e pelo ultranacionalista Vladimir Zhirinovsky, com 9%, em números arredondados. O candidato liberal Andrei Bogdanov tem menos de 1%. A pesquisa indica comparecimento de 80%, mas Gudkov acredita que ele seja menor, na casa de 70%.
A intenção de voto em Medvedev, escolhido por Putin para ser seu sucessor, aproxima-se da popularidade do presidente, também de cerca de 80%. Eleito em 2000 e reeleito em 2004, Putin não pode mais candidatar-se a presidente, e anunciou que Medvedev, seu ex-chefe de gabinete, de 42 anos, vai indicá-lo primeiro-ministro, de maneira que ele continuará governando o país.
A maioria dos russos credita a Putin os altos índices de crescimento econômico, que em 2007 atingiu 8%; a queda do desemprego, que está em 6%, e a estabilização do país, depois do caos vivido com o fim da União Soviética, em 1990. Os eleitores também acham que Putin restabeleceu o orgulho ferido da Rússia no cenário internacional, com uma política externa agressiva diante dos Estados Unidos e da União Européia.
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