Egípcios fazem filas para protestar em praça

Pelo 13º dia consecutivo, funcionários públicos põem em jogo emprego e mulheres lideram manifestações na praça central do Cairo, cercada pelo Exército

CAIRO – São 15h25. Uma chuva fina e fria cai sobre o centro do Cairo. Mas os manifestantes continuam chegando à Praça Tahrir, para exigir a saída do presidente Hosni Mubarak, no poder há 30 anos. Na principal das cinco entradas controladas pelos manifestantes e vigiadas pelo Exército, a da Avenida Kasr El Nil, continuação da ponte sobre o Rio Nilo, a fila tem cerca de 300 pessoas. No final dela, estão Hany Mohamed, de 32 anos, e Adel Wagdi, de 31. Os dois trabalham na área de informática do Conselho Supremo da Cultura, que cuida do espetacular patrimônio histórico do país. Eles saíram do trabalho, às 15h, e vieram para a manifestação. Mohamed dorme na praça há três noites, assim como milhares de outros manifestantes acampados.

“Não tem problema? Por serem funcionários públicos?”, pergunta o repórter do Estado. “Eles não sabem”, responde Wagdi, referindo-se aos chefes da repartição. “Eu acho que sabem”, discorda Mohamed. “Você é jornalista?”, perguntam. “Sim, mas não contem a ninguém”, pede o repórter. Eles sorriem, com cumplicidade. Nos últimos dias, dezenas de jornalistas, inclusive brasileiros, foram espancados por policiais e manifestantes pró-Mubarak e detidos pela polícia e pelo temido serviço secreto, a Mukhabarat.

A espera na fila dura 11 minutos. Mulheres entram por uma fila separada. A multidão se dilui em muitas manifestações na praça cercada pelo Exército, e várias delas são lideradas e compostas exclusivamente por mulheres. Mas elas também se misturam com os homens, algumas de mãos dadas e até abraçadas a eles, ainda que usando o véu islâmico. Fileiras de voluntários verificam os documentos e revistam os manifestantes. Depois das repetidas averiguações, há um corredor polonês de manifestantes que dão as boas-vindas gritando: “Aqui está o povo egípcio.” Sua euforia parece inabalada, depois de 13 dias de protestos.

Muitos na praça trazem ferimentos no rosto e na cabeça, sinais da batalha campal da semana passada contra manifestantes pró-Mubarak que invadiram a praça. Um homem permanece deitado no meio da multidão, com a testa coberta por uma bandagem e dois dedos da mão direita fazendo o “V” da vitória. Um desconhecido se inclina e beija o curativo. Atendidos por médicos e enfermeiros voluntários num hospital de campanha improvisado na calçada, os feridos são tratados como heróis.

Publicado no Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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