Número 2 do regime reúne-se com opositores, incluindo a Irmandade Muçulmana, mas manifestantes insistem na saída de Mukarak
CAIRO – Pressionado pelos protestos que exigem sua saída há quase duas semanas, o governo do presidente Hosni Mubarak ofereceu ontem uma série de concessões, incluindo a revisão das leis de emergência que vigoram há três décadas e das normas que impedem candidatos de oposição de disputar eleições em igualdade de condições. As negociações, encabeçadas pelo recém-nomeado vice-presidente Omar Suleiman, incluíram até mesmo a banida Irmandade Muçulmana, que participou de reunião em separado. A oposição reagiu com cautela.
Suleiman propôs a criação de um comitê formado por políticos e juristas para elaborar mudanças na Constituição, retirando os entraves aos candidatos da oposição. Ele também prometeu soltar prisioneiros políticos e remover as restrições à liberdade de imprensa. E uma investigação ampla sobre a retirada abrupta da polícia das ruas depois da eclosão dos protestos, que levou a uma onda de saques, assim como a atuação de grupos pró-governo que atacaram os manifestantes – duas ações aparentemente destinadas a criar o caos para justificar a repressão dos protestos pelo regime.
Mas a suspensão do estado de emergência imposto no país desde 1981, quando Mubarak assumiu, estaria condicionada “ao fim das ameaças à segurança nacional”. O regime continua rejeitando a principal exigência da frente de 14 partidos formada no calor dos protestos que eclodiram no dia 25: a saída de Mubarak e a formação de um governo de transição com participação da oposição, para garantir a realização de eleições justas para presidente em setembro, assim como a dissolução do atual Parlamento, eleito em dezembro sob acusações de fraude.
“O processo é opaco”, disse Mohamed ElBaradei, ex-secretário-geral da Agência Internacional de Energia Atômica e um dos principais líderes da oposição. “É todo gerido pelos militares.” Antes de ser nomeado vice-presidente, no dia 29, Suleiman, formado na Academia Militar de Moscou, dirigia o serviço de inteligência desde 1993. Expressando um temor presente também entre os manifestantes nas ruas, que não querem voltar para casa, Baradei disse que, “se Mubarak não for embora, o regime vai recuperar suas forças e voltar para se vingar”.
A Irmandade Muçulmana também não saiu contente das conversações. De acordo com um de seus líderes, Abdel Moneim Aboul Fotouh, Suleiman não atendeu as principais exigências da oposição – a renúncia de Mubarak e a dissolução do Parlamento. O grupo deve reunir-se hoje para decidir se continuará participando das negociações.
Mubarak já havia feito concessões na semana passada para tentar aplacar as manifestações, mas sem sucesso. Aos 82 anos, ele prometeu não se candidatar na eleição presidencial de setembro. Dias depois, garantiu que seu filho, Gamal, que supostamente estaria sendo preparado para sucedê-lo, também não se candidataria.
Tensão – Soldados egípcios dispararam rajadas de metralhadora ontem às 19h50 locais (15h50 em Brasília) para dispersar manifestantes que chegaram muito perto de seus tanques, estacionados em frente ao Museu Egípcio, na Praça Tahrir, centro do Cairo. Não ficou claro se os manifestantes eram favoráveis ou contrários ao presidente Hosni Mubarak. Ao ouvir os disparos, a multidão no interior da praça, que exige a saída do presidente, correu em direção aos tanques do Exército. Foi o momento mais tenso do dia. Ninguém saiu ferido.
Muitos deles policiais à paisana ou homens contratados para provocar confrontos, os ativistas pró-governo concentram-se noutra praça, Abdel Moniem, próxima dali, mas longe do simbolismo da Tahrir (Liberação). Eles perderam a batalha pela praça, na semana passada, e foram separados dos rivais pelo Exército, que usufrui da simpatia dos manifestantes anti-governo. Na noite anterior, o Exército tentou, sem sucesso, desocupar as ruas e avenidas que cruzam a Praça Tahrir, para liberar o tráfego. A ideia era que os manifestantes recuassem para as calçadas – que visivelmente não têm espaço suficiente para todos. Mas eles resistiram e os militares desistiram.
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