Atentados matam 40 e ferem mais de 100 em dia de eleição no Iraque

Em alguns locais, explosões alcançam média de quatro por minuto; onda de violência não intimidou eleitores

BAGDÁ – Uma onda impressionante de ataques com morteiros, foguetes, granadas de mão e bombas em Bagdá e noutras partes do Iraque matou ontem pelo menos 40 pessoas e feriu mais de 100, mas não impediu que muitos iraquianos saíssem para votar na segunda eleição para o Parlamento – que escolherá o primeiro-ministro e o presidente – desde a invasão de 2003.

Não foram divulgados resultados nem dados nacionais de comparecimento. Mas, segundo os números apresentados pelas autoridades regionais, ele foi alto nas províncias que concentram a população sunita, que boicotou as eleições parlamentares de dezembro de 2005. Em Diyala, reduto da Al-Qaeda, o comparecimento foi de 90%; em Anbar, antigo reduto do grupo terrorista, 64%; em Salahedin, 62%, e em Ninive, 65%.

Curiosamente, a participação foi menor nas províncias de maioria xiita: de 46% a 64%, informou a France Presse. Em Kirkuk, disputada entre árabes e curdos, 70% dos eleitores foram votar. Em 2005, o comparecimento atingiu 79,6% na média nacional.

Os ataques começaram antes das 7 horas em Bagdá (1 hora em Brasília), quando as urnas abriram. Por volta de 8h30, as explosões alcançavam uma média de quatro por minuto, no raio de distância em que podiam ser ouvidas do Hotel Al-Mansour, na região central de Bagdá. Os morteiros e foguetes tinham como alvo a chamada Zona Verde, onde se concentram edifícios do governo, o comando militar americano e embaixadas importantes como a dos Estados Unidos.

Os atentados a bomba atingiram tanto bairros xiitas quanto sunitas. A sua autoria não ficou clara, como tem acontecido desde o recrudescimento dos atentados, no ano passado. O “Estado Islâmico do Iraque”, como a Al-Qaeda se autodenomina, havia anunciado na sexta-feira um “toque de recolher” para ontem, advertindo, em seu site na internet: “Quem o desafiar se exporá à fúria de Alá e a todos os tipos de armas dos mujaheddin (combatentes da guerra santa).” O grupo sunita considera as eleições de ontem a consolidação do domínio do Iraque pela maioria xiita.

Mas muitos iraquianos acreditam que pelo menos parte desses ataques – como vinha ocorrendo nos últimos meses – pode ter sido perpetrada por inimigos políticos do primeiro-ministro Nuri al-Maliki, cujo grande trunfo nas eleições provinciais de janeiro do ano passado, que sua aliança venceu, foi a redução da violência.

No maior atentado de ontem, uma bomba aparentemente colocada num apartamento térreo demoliu um edifício residencial de três andares no bairro de Ur, no leste de Bagdá, matando 25 pessoas. No mesmo bairro, atentado semelhante matou outras quatro pessoas. Em ações aparentemente coordenadas, houve um intervalo de meia hora entre as duas explosões, que ocorreram antes das 8 horas. No bairro de Shurta, oeste da cidade, outra explosão semelhante também destruiu um edifício, matando 7 pessoas e ferindo 16.

Três eleitores foram mortos no bairro xiita de Hurriyah por uma granada lançada por um homem perto de uma seção eleitoral. Já um morteiro matou três pessoas na parte oeste da cidade, segundo fontes policiais citadas pelas agências internacionais.

Os disparos e explosões em Bagdá, que tinham o claro objetivo de intimidar os eleitores, diminuíram por volta do meio-dia e praticamente desapareceram à tarde. Pela manhã, os bloqueios militares e policiais não permitiam a passagem de praticamente nenhum carro civil a não ser ambulâncias. As ruas ficaram semidesertas. Os eleitores que se aventuraram a sair de casa tiveram de ir votar a pé.

À tarde, a circulação de veículos foi liberada, e o comparecimento às urnas se intensificou. De acordo com a Alta Comissão Eleitoral Independente, os ataques causaram o fechamento de apenas duas seções eleitorais, por um breve período.

“Esses atos não minarão a vontade do povo iraquiano”, disse Maliki, ainda pela manhã. “Este dia significa para nós completar a construção da democracia, do processo político, tendo como alicerce nossos cidadãos.”

“Hoje é um dia épico”, celebrou o dirigente do grupo sectário xiita Conselho Supremo Islâmico Iraquiano (ISCI), Amr al-Hakim, um dos principais rivais de Maliki, também xiita, nessas eleições. “É o chamado da consciência, da pátria e da marjaiya (liderança espiritual xiita).”

Seu antigo rival e atual parceiro na Aliança Nacional Iraquiana, o clérigo Moqtada al-Sadr, exortou: “Embora eleições sob a sombra da ocupação não sejam legítimas, peço ao povo iraquiano que participe como ato de resistência política, para que o terreno seja preparado para os ocupantes deixarem o Iraque.”

Do sucesso dessas eleições depende a retirada americana do Iraque, promessa de campanha do presidente Barack Obama. O plano prevê a redução de 100 mil para 50 mil soldados até agosto, e a total retirada até o fim do ano que vem.

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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