Atenderam a convocação das forças invasoras para restaurar a ordem em Bagdá
BAGDÁ – Agora sob nova direção, os velhos uniformes verde-oliva tiveram sua reestréia ontem nas ruas de Bagdá. Atendendo a convocação dos militares americanos, um punhado de oficiais iraquianos compareceu timidamente ontem, por volta de meio-dia, ao Hotel Palestina, para receber orientações de comandantes à paisana que agora colaboram com as forças da coalizão, antes de sair às ruas, para começar o primeiro policiamento em Bagdá desde a queda do regime há uma semana.
Em seguida, os integrantes do embrião da nova polícia iraquiana pós-Saddan saíram em carros ainda sem insígnias da corporação, escoltados por veículos blindados de soldados americanos. Foi um primeiro passo rumo à normalização, numa cidade ainda castigada por saques, assaltos e incêndios propositais, além das escaramuças entre soldados leais a Saddam e as forças americanas, da falta de energia elétrica, água e telefone.
A TV estatal, também sob nova direção, veiculava ontem – para os poucos iraquianos com gerador em casa – advertências acerca dos saques e assaltos. Noutro anúncio, a voz de um locutor pedia aos soldados iraquianos que não obedecessem a ordens de atear fogo aos poços de petróleo: “Eles são a riqueza do povo iraquiano e Saddam a vem destruindo ao longo de 35 anos.”
Os disparos de fuzis-metralhadora continuaram a ser ouvidos de dia, intensificando-se pela noite. Os saqueadores costumam disparar suas armas para o alto, para espantar os moradores, antes de entrarem em ação. Não havendo mais o que saquear, o destino final dos edifícios é normalmente o incêndio. O prédio do Ministério das Relações Exteriores, já semidestruído pelos bombardeios, estava em chamas ontem à tarde, assim como o dos Transportes e Comunicações. Como não há bombeiros, os prédios queimam até o fogo se extinguir espontaneamente.
Mas uma parte dos disparos de fuzis AK-47 também são ataques dos fedayn (combatentes) de Saddam contra as tropas americanas, que respondem com fuzis e tanques. Na noite de domingo, três fedayn se alojaram num prédio em frente ao Hotel Palestina, onde se concentram jornalistas estrangeiros, e dispararam contra fuzileiros navais americanos que rodeiam o hotel. Apoiados por helicópteros e tanques, os americanos entraram no edifício e capturaram os três.
Em Al-Mansur, uma área elegante de Bagdá, por volta do meio-dia, tanques bloquearam a Avenida 14 de Hamadan, uma das mais importantes da cidade, depois que os fedayn dispararam contra as tropas americanas. Soldados apontaram os canhões para os carros que vinham pelas ruas perpendiculares à avenida, levando os motoristas a fazer rápidas manobras para buscar abrigo nas ruas paralelas.
Mais tarde, foi a vez da Avenida Abu Nuass, na margem do Rio Tigre. Os soldados nos tanques e veículos blindados estacionados no início da avenida calcularam que havia 20 homens armados nos quarteirões adiante. Os disparos de fuzis e de tanques continuavam ontem à noite, mas em menor intensidade do que na véspera.
O comércio continua fechado em Bagdá, com exceção de algumas mercearias e cafés onde os homens se sentam na calçada, jogam cartas e gamão e fumam narguilé, aparentemente indiferentes ao que se passa ao seu redor. Ao anoitecer, a cidade está sob toque de recolher.
Nos poucos hotéis em funcionamento em Bagdá – com exceção do Palestina, guardado pelos marines -, as portas são trancadas ao escurecer, os recepcionistas se armam de fuzis Kalashnikov e se deitam atrás dos balcões quando os disparos soam mais próximos.
As ruas menores e pistas de várias avenidas continuam fechadas pelas barricadas erguidas antes da guerra. Há sacos de areia empilhados pelas calçadas nos preparativos para a resistência – que não se concretizou em Bagdá – contra os invasores americanos. Carcaças de veículos carbonizados por mísseis, escombros de prédios, vigas de ferro retorcidas, guard-rails entortados compõem o cenário de desolação.
Vai demorar muito para que os moradores de Bagdá sintam algo remotamente parecido com a normalidade.
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