Ele reconhece, no entanto, papel da religião no conflito
DAMASCO – Com a evolução do conflito na Síria, tem havido um alinhamento entre sunitas, de um lado, e cristãos e alauítas – a seita do presidente Bashar Assad –, de outro. Louay Hussein, no entanto, presidente do partido Construindo o Estado Sírio, criado em setembro, um dos oposicionistas mais conhecidos no país, é alauíta. Hussein, de 51 anos, que se mantém distante do Conselho Nacional Sírio (CNS), a oposição no exílio, da qual participa a Irmandade Muçulmana, nega a possibilidade de um grupo sunita radical tomar o poder na Síria.
Preso durante sete anos na década de 80, articulista de política em jornais libaneses, Hussein propõe uma transição para a democracia com a participação do presidente e dos oposicionistas, e sem intervenção estrangeira. Ele concedeu a seguinte entrevista ao Estado na sede de seu partido em Damasco, onde militantes, visivelmente de classe média, preparavam para hoje o seu primeiro ato junto com o Comitê de Coordenação Nacional, (CCN) que reúne outros grupos de oposição, dentro da Síria.
O cessar-fogo muda alguma coisa?
Certamente, porque uma parte dos oposicionistas voltou a se manifestar pacificamente.
É possível alguma forma de negociação com esse regime?
Estamos num processo de negociação indireta, por meio da missão de Kofi Annan. Por isso pedimos ao regime para observar o cessar-fogo e retirar suas tropas das ruas, e pedimos a outros grupos para também obedecer esse cessar-fogo.
Quais as diferenças entre seu grupo e o CNS e o CCN?
Estamos num processo de luta contra o regime, dentro da Síria, enquanto que outros grupos estão esperando para entrar na luta depois que o regime cair. Podemos atuar em conjunto com o CCN muito mais do que com o CNS, porque eles (o Comitê) também estão dentro da Síria e temos a mesma perspectiva.
Alguns dizem que o CNS é dominado por sunitas radicais. O senhor concorda com isso?
Não é segredo para ninguém que a Irmandade Muçulmana é um dos grupos mais fortes no Conselho.
Há o risco de o país cair nas mãos de algum grupo sunita radical?
Levando em conta o mosaico de seitas e etnias da Síria, é muito difícil um grupo islâmico reunir força suficiente para tomar o poder no país.
Qual o peso da religião nesse conflito, considerando que a maioria dos alauítas e cristãos apoia o regime?
Definitivamente ela tem um papel. Muitas pessoas acreditam que os sunitas em especial eram injustiçados. Antes da rebelião, a parcela de alauítas na oposição era bem maior que a de sunitas. Tanto que a maioria dos oposicionistas conhecidos é alauíta.
Qual sua proposta de transição democrática?
Queremos que uma coalizão conduza o país à democracia. Mas essa é uma tarefa difícil agora. Definitivamente a transição deve ser compartilhada com o regime. Não que deva ser conduzida por Bashar Assad. O regime será parte, não líder da coalizão.
O senhor é contra intervenção externa?
Claro, tanto militar quanto política, no sentido de que eles desenhem o modelo do novo regime.
O que acha da posição do Brasil?
Tivemos uma reunião muito boa com o embaixador do Brasil (Edgard Casciano). Ele entendeu muito bem nossa posição como partido oposicionista, embora, como você sabe, o Brasil seja parte do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), que apoia esse regime.