A versão apresentada pela BBC faz uma paródia do original da Globo
LONDRES — O Canal 1 da BBC estreou uma adaptação do programa Você Decide, da Rede Globo. A versão inglesa dos dilemas éticos na TV se chama Faça a Coisa Certa, e é apresentada pelo veterano dos programas de auditório Terry Wogan. A BBC-1 literalmente comprou a idéia da Globo.
O programa é assinado por uma produtora independente, “em associação com a TV Globo do Brasil”, conforme os créditos finais.
A grande diferença é que o de cá não é sério. Tudo é feito com humor. E é um programa de auditório, com um painel de jurados e uma platéia, ambos votando e opinando conforme o episódio se desenrola. Assim como no original, os telespectadores também votam pelo telefone — com um número para o “sim” e outro para o “não” — e decidem como deve ser o final. A história é recheada com o que os ingleses chamam de twists, literalmente “viradas”, que fazem as pessoas irem mudando de opinião.
No primeiro episódio, apresentado sábado em horário nobre (20hl5), Tony, o herói, é em princípio honesto, mas está desempregado há dez meses. Ele, a mulher e o filho assistem aos credores dilapidando a casa, levando até o aparelho de som para pagar a hipoteca. Eis que um amigo o convida para ir ao Jóquei, oportunidade de conhecer gente rica e conseguir emprego.
Lá, Tony vê uma nota de 50 libras (US$ 75) cair da carteira de um freqüentador. Aí o episódio pára, e o “âncora” Terry Wogan pergunta: fica ou não com o dinheiro? O painel, no caso, o humorista Frank Skinner, a escritora Jilly Conter e o juiz aposentado James Pickles, dão suas previsíveis opiniões.
O humorista faz o “malandro”, que não só fica com as 50 libras como conta uma história de quando ele e um amigo acharam outras 80, numa carteira, que gastaram imediatamente, mas foram legais em não usar os cartões de crédito. Jilly é o meio-termo. Ela própria não ficaria, mas diante da situação precária do herói Tony — cujo filho fará aniversário em poucos dias, e corre o risco de ficar sem presente —, a atriz embolsa o dinheiro. Mostrando-se perplexo, o juiz faz um sermão, ainda que bem humorado, explicando que a lei é clara se você sabe a quem pertence algo, e mesmo assim não devolve, você roubou.
Depois vota o auditório, como diz Wogan, com os pés: as arquibancadas são divididas entre “sim” e “não”, e as pessoas escolhem o lado de acordo com sua opinião.
A história segue, e Tony vai devolver o dinheiro. O dono agradece e o convida a acompanhá-lo nas apostas. Relutante, Tony concorda, para assistir ao apostador ganhar 50 mil libras numa corrida. O homem a quem ele devolveu as preciosas 50 libras se revela arrogante, apostador e beberão compulsivo, solitário e riquíssimo. Ao rever pela televisão do pub do Jóquei o final da corrida em que ele foi premiado, o apostador tem um ataque cardíaco e morre. A platéia ri e aplaude. O jurado Skinner reconhece que teria sido um erro não ir devolver as 50 libras.
Lá está o endividado Tony com uma mala de 50 mil libras e um problema ético. Novas opiniões do painel. Tony volta rico para casa. Mas a televisão noticia a morte do apostador, e diz que ele era o único grande sustentador de um orfanato, que agora ficará fechado sem suas contribuições. Novo dilema. Aí Wogan dá o resultado pelo telefone: 61% a favor de ficar com o dinheiro.
O orfanato fecha, Tony se arrepende e resolve assim o problema: volta ao Jóquei para multiplicar o dinheiro, guardando sua parte e ajudando o orfanato. Não só perde tudo, como é reconhecido por funcionárias do Jóquei, e a polícia bate à sua porta A platéia ri: já sabia que o crime — na televisão — não compensa.