Toda a movimentação do mercado de créditos de carbono gira em torno do que os especialistas chamam de “mitigação”, ou seja, a redução da emissão de gases.
A outra ponta do negócio, a absorção desses gases pelas florestas, na qual países como o Brasil têm um enorme potencial, ainda não se desenvolveu. Por dois motivos: o desinteresse dos europeus, que afinal não têm florestas e estão inteiramente concentrados em ganhos de eficiência na indústria, e as dificuldades inerentes em medir o desempenho das florestas.
Enquanto as regras da tal mitigação já estão razoavelmente definidas, ainda não há uma metodologia aceita sobre como medir e monitorar o chamado “seqüestro” dos gases pelas árvores, que, para crescer, consomem gás carbono. Aqui, também, os brasileiros, principais interessados, estão tomando a iniciativa.
Técnicos da AES Tietê, que quer reflorestar as margens do rio, ao longo do qual possui dez usinas, elaboraram uma proposta de metodologia de medição para as florestas brasileiras – em especial a mata atlântica – e a apresentaram em novembro ao Comitê Executivo da Convenção de Mudanças Climáticas da ONU, em Bonn. Segundo Demóstenes Barbosa da Silva, diretor de Regulação e Relações Institucionais da AES Tietê, além da brasileira, só surgiu uma proposta de Belize, a diminuta ilha caribenha.
O Comitê Executivo alega que vai aprovar uma metodologia universal, que se aplique a qualquer floresta, e a discussão está nesse pé. Demóstenes espera que as regras sejam definidas ainda este ano. A AES Tietê dispõe de uma faixa de 5 mil quilômetros de extensão por 30 metros de largura às margens do rio, 90% dos quais precisam ser reflorestados. A empresa estima o custo entre R$ 20 milhões e R$ 30 milhões. “E não vamos aumentar a venda de energia com isso.” Daí a idéia de financiar o empreendimento com créditos de emissão de gases.
Projetos de reflorestamento são vistos com ceticismo no mercado. A norueguesa DNV, uma das cinco empresas credenciadas pela ONU para avaliar e monitorar projetos de redução de emissões, não aceita propostas de seqüestro de carbono. “As regras ainda estão em discussão, há muita incerteza e não queremos emitir certificados que possam ser questionados”, explica Samuel Barbosa, diretor da DNV no Brasil.
Há, ainda, objeções, por parte das organizações não-governamentais, sobre o valor do reflorestamento com árvores não nativas, como o eucalipto. “O Brasil tem muito potencial para isso: tem território água e luz”, observa o consultor Fábio Feldman, ex-secretário do Meio Ambiente de São Paulo. “Pessoalmente, sou a favor, mas as ONGs resistem.” E esse é um mercado que robustece a posição das ONGs. A condenação de um projeto por uma ONG “faria o preço de um certificado ir para o chão”, diz Feldman. “É um mercado muito sensível.”
E elas estão inquietas. “Está muito inflacionada a discussão sobre o mercado de carbono, há uma supervalorização do MDL”, acredita Marcelo Furtado, diretor de campanhas do Greenpeace. “A solução não é dar ao rico o direito de poluir, porque tem dinheiro para comprar créditos, mas forçar o cumprimento de metas efetivas de redução da emissão.”
Para Furtado, o foco das políticas públicas deve ser evitar que o aumento da temperatura no mundo alcance 2 graus centígrados acima do índice pré-industrial. O dirigente do Greenpeace acha também que o Brasil não pode esperar até 2012, período em que está isento de metas, para se comprometer a conter o desmatamento, que responde por 70% de suas emissões de gases do efeito estufa.