LONDRES — Nesta segunda parte da entrevista, o saudita Fahad al-Tayash, doutor em Comunicações Sociais
Até há um ano professor da Universidade Rei Saud, em Riad, e atualmente editor-executivo do jornal Asharq al-Awsat, analisa o choque de civilizações e defende a educação e a informação como meios de superá-lo.
Estado — A Arábia Saudita tem sido criticada por não cumprir as promessas de reformas democráticas depois da Guerra do Golfo. Como o sr. avalia o regime do seu país?
Al-Tayash – Acho que isso é parte de uma campanha contra a Arábia Saudita. Quem diz isso nunca visitou o país, com todo o respeito. Também sou um pouco crítico em relação ao meu país. Mas o que temos na Arábia Saudita está muito além dos outros países em termos de participação. Nós podemos ir diretamente até o rei. Temos nosso próprio modelo de democracia, construído a partir de nossa cultura única. Respeitamos os idosos, os grupos tribais. As autoridades não abusam do poder, como vemos no resto do mundo, corrupção desvios de verbas, etc. Não chamamos nosso modelo de democracia, mas de Shura (conselho consultivo). É um processo de consultas. Você dá a sua opinião e os políticos decidem.
Estado – Os conselheiros são eleitos pelos cidadãos?
Al-Tayash – Não. São 60 membros indicados pelo rei. Mas eles são os individuos mais capazes do país. São meus colegas do mundo acadêmico. São excelentes.
Estado – Mas por que não deixar que os cidadãos elejam seus representantes?
Al-Tayash – A Arábia Saudita não quer precipitar esse processo, mas criar uma cultura de participação. O governo está fazendo isso gradualmente.
Estado – Mas o objetivo é formar uma democracia do estilo ocidental?
Al-Tayash – Não. Por que temos de nos adaptar ao estilo ocidental. Somos tolos se não agirmos como os ocidentais? Não. Não. Existem tantas culturas no mundo! Cada uma deve for mar seu próprio sistema de participação. Não tem de ser todo mundo igual, chineses, japoneses, árabes e latino-americanos imitando o modelo ocidental. O mundo ficaria muita pobre desse jeito. Somos unificados pelos princípios morais, mas somos diferentes na maneira como administramos nossas vidas.
Estado – Voltando à questão do fundamentalismo. O sr. prevê uma escalada no confronto entre as duas civilizações, ocidental e muçulmana, uma nova Cruzada?
Al-Tayash – Não acho que a perspectiva seja tão sombria. Mas o conflito está se acirrando. Quando duas civilizações competem, as diferenças entre elas afloram. Trata-se de fés, de modos de viver.
Estado – Quem está no páreo?
Al-Taysh – O Cristianismo e o Islamismo. O Islamismo. O Judaísmo não acolhe novos adeptos, e portanto está de fora. Mas o Cristianismo e o Islamismo são religiões abertas. O sr. é um cristão hoje, e pode se tornar um muculmano amanhã. Posso classificá-lo de terrorista? E vice-versa. Essa competição está dando origem a esses confrontos. Mas tomara que essa atmosfera de desentendimento e rotulação, são o modo de alcançar um entendimento. Vamos deixar claro: as pessoas são assim, acreditam nisso ou naquilo. Só que, quanto mais o Ocidente rotula, mais cria antipatia. A propósito, o Islã é a religião que, mais cresce nos EUA. Podemos chamar os americanos de terroristas? As projeções mostram que os latinas vão se tornar a maioria da população nos EUA. Será que continuarão sendo chamados de imigrantes ilegais? Essa é a terminologia usada pelos políticos e incorporada pela mídia indiscriminadamente, criando um clima de desentendimento entre culturas e nações. Eles querem que todo mundo seja democratizado. Mas como? É o modelo ocidental. Ou temos nosso modelo?
Estado – Qual é a sua resposta?
Al-Tayesh – Não podemos importar modelos. Não existe um modelo puro. O sr. acha que os EUA são uma democracia pura e verdadeira? Isso é uma balela. O sr. acha que um hispânico será presidente dos EUA? Ou um judeu? Nem vamos falar de muculmanos, ou de negros, mas dos que estão mais próximos da cultura. Nunca serão nem congressistas importantes, membros dos comitês que decidem as coisas. Essas pessoas nunca chegarão lá pelo sistema atual. Isso é a democracia.