México tem maior protesto desde desaparecimentos

Cerca de 30 mil manifestantes se reuniram no centro da capital, e muitos pediram a saída do presidente

CIDADE DO MÉXICO – Na maior manifestação desde o desaparecimento de 43 estudantes no dia 26 de setembro, cerca de 30 mil pessoas ocuparam ontem o Zócalo, a praça central da Cidade do México, e outros milhares se espalharam pelas ruas ao redor. Muitos manifestantes exigiram a saída do presidente Enrique Peña Nieto, acusado não só de omissão frente ao crime organizado e aos constantes massacres, mas também de corrupção, além do descontentamento de sindicalistas e estudantes com as reformas liberais do governo. Uma “greve cívica” foi convocada para o dia 1.°.

Durante três horas, a manifestação transcorreu pacificamente, com apenas 10 policiais federais observando discretamente de uma esquina do Palácio Nacional, sede do governo, que teve parte da porta principal queimada na última manifestação, dia 8. Por volta de 20 horas (meia-noite em Brasília), cerca de 50 jovens mascarados tentaram forçar a passagem pela barreira de metal que protegia o palácio, lançando coquetéis molotov e pedras contra a porta recém-restaurada. Reforços policiais chegaram e dispersaram o grupo com bombas de gás lacrimogêneo. Quinze pessoas – 12 rapazes e 3 moças – foram detidas, incluindo um chileno. Dois jovens ficaram feridos.

Mais cedo, um dos oradores no palanque montado na praça havia pedido que os mascarados exibissem os rostos, fazendo um apelo para que não houvesse violência. Quando o grupo avançou contra o palácio, vários manifestantes tentaram dissuadi-los, sem sucesso. Antes desse episódio, o clima estava descontraído, com grupos de dança indígena encenando rituais ao som de tambores no Paseo de la Reforma, que conduz à praça. Dois enormes painéis luminosos com as imagens de Pancho Villa e Emiliano Zapata, heróis da Revolução Mexicana (1910), que fazia aniversário na quinta-feira, adornavam o Zócalo.

Chamava a atenção também o professor Ismael Padilla, que dá aula no ensino médio em Guadalajara. Vestido de revolucionário mexicano, com um grande “sombrero”, bigodes artificiais e o clássico pente de balas formando um “X” no tórax, ele protestava não só contra os desaparecimentos, mas também contra a reforma na educação, promovida por Peña Nieto, que vincula os salários e contratações de professores ao seu desempenho. Eletricistas e trabalhadores em telefonia também protestavam contra as privatizações.

Assim como a maioria dos manifestantes, o presidente Peña Nieto também tem demonstrado moderação. Ele havia afirmado ao longo da última semana, e reiterou ontem, que o direito de manifestação seria respeitado, mas que não toleraria atos de violência e vandalismo. Os militares transferiram sua tradicional cerimônia de aniversário da revolução do Zócalo para um campo de equitação, para evitar confrontos.

O tom mais belicoso foi o dos estudantes de Guerrero, onde os jovens desapareceram. Munidos de bastões de madeira e protegidos por capacetes e máscaras, eles gritavam: “Cuidado com Guerrero, Estado guerrilheiro”, numa referência à presença história de grupos armados no Estado, incluindo o Exército Popular Revolucionário (EPR), única guerrilha formalmente em atividade no país – embora seus últimos atentados, contra oleodutos da estatal do petróleo Pemex, tenham ocorrido em 2007.

Alguns pais trouxeram até seus filhos. Era o caso do médico Eric Reyes, de 38 anos, que veio com a mulher, Laura, de 28, e a filha Sofía, de um ano e sete meses, trazendo um cartaz que dizia: “Nossos filhos não merecem um narco-governo”. Segundo Reyes, o caso dos 43 jovens “se acumula com um descontentamento geral por outros desaparecidos na guerra do narcotráfico, pela corrupção do governo, que só quer tapar a realidade, por todas as reformas e a injustiça”.

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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