Famílias substitutas podem ter mais sucesso que Poder Público

Crianças e adolescentes de rua exigem limites e afeto, como quaisquer outras

 

 

PORTO ALEGRE – Com a ajuda de duas jornalistas, os moradores de rua de Porto Alegre fazem um jornal, o Boca de Rua, no qual contam suas histórias e dão seus depoimentos, além de vendê-lo para levantar algum dinheiro. Cedendo ao assédio de meninos de rua, que queriam participar do jornal, foi criado em março um suplemento para eles, o Boquinha. Com uma diferença: as crianças não podem vender o jornal – embora algumas vendam –, e recebem uma ajuda de custo de R$ 10 por semana.

Na próxima edição, o suplemento trará um “estatuto da criança e do adolescente” redigido por esses meninos de rua, que se reuniram para discutir quais deveriam ser os seus direitos. Entre as reivindicações, estão “colo de mãe”, que gostem deles como eles são, respeitar e serem respeitados (ver quadro).

No convívio com as cerca de 20 crianças que participam da confecção do Boquinha, a jornalista Rosina Duarte constatou que, em meio à enorme diversidade de casos, parece haver só uma regra: “O tratamento tem de ser individualizado. Não se pode estabelecer uma linha para todo mundo.”

A conclusão é a mesma a que chegou o coordenador do Movimento dos Meninos e Meninas de Rua de Porto Alegre, Luís Antonio Ryzewski. Para ele, é impossível, numa instituição com dezenas de crianças ou adolescentes, estabelecer o tipo de relacionamento de que eles necessitam. “Eles são iguaizinhos aos nossos filhos, querem limite e afeto”, diz Rosina.

Ryzewski nota que, na relação entre os adolescentes e os educadores, há pouca exigência de contrapartida e respeito. “Se eles são desrespeitosos e não acontece nada, eles se tornam hostis”, diz Ryzewski. “Queremos que eles sejam normais, como os garotos que têm família. Se meu filho não tiver pressão, não vai acordar às 6h30 para ir à escola.”

A psicóloga Lirene Finkler, do Acolhimento Noturno, argumenta que uma coisa são os pais, que têm uma história com seus filhos, fazerem exigências e imporem sanções. Outra é um desconhecido. A criança ou adolescente não terá por que confiar nele, e ele a perderá.

A própria natureza do serviço público e de seus funcionários, por mais capazes e bem intencionados que sejam, parece conspirar contra o êxito do atendimento. “Sentimos que, para esses funcionários, em primeiro lugar vem o seu emprego no serviço público”, observa Ryzewski. “Atender as crianças em estado de vulnerabilidade está em segundo plano.”

Daí os melhores resultados com as famílias substitutas, amplamente empregadas nos EUA (ler matéria a respeito). Os técnicos em Porto Alegre reconhecem que o atendimento precisa ser mais individualizado, e há discussões sobre montar casas para abrigar um número bem menor de pessoas, no lugar dos albergues, que reúnem dezenas delas. 

 

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