Lavradores do sertão da Paraíba dizem que a vida melhorou

Programas sociais, crédito fácil e obra de represa atingem em cheio trabalhadores de fazendas no interior da Paraíba e definem seu voto

 

UIRAÚNA – No sertão da Paraíba, os lavradores que trabalham nas fazendas, em troca de diária, merenda e almoço, são chamados de “moradores”, porque suas casas ficam dentro das terras dos patrões. Nas fazendas Riachão e Rio dos Peixes, perto de Uiraúna, 464 km a oeste de João Pessoa, moram nove famílias. As nove tiveram seus barracos de taipa (amarração de paus e enchimento de barro) trocados por casas de alvenaria pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa), para evitar doenças como o mal de chagas, transmitido pelo barbeiro. É só um exemplo de como os programas do governo federal têm mudado a vida dos sertanejos – com fortes repercussões sobre seu comportamento eleitoral.

Eles começam a trabalhar às 7 horas, param às 11 para o almoço, descansam, retomam às 13 e vão até as 17 horas. Depois do almoço, à sombra de um juazeiro, cinco moradores que faziam uma cerca na Fazenda Riachão, e que recebem diária de R$ 20, conversaram com o Estado sobre o que acham do governo do presidente Lula e sobre as eleições deste ano.

“Para o pobre, ele é muito bom”, começa Geraldo Daniel Duarte, o Geraldo Zé das Dores, de 58 anos. “Hoje, acabou os pobres. Mudou muitas coisas”, continua Das Dores, capataz da fazenda, sob o olhar de aprovação dos outros. Eles passam a enumerar os programas federais.

O primeiro que Das Dores cita é o Seguro Safra, que segundo ele lhe pagou um total de R$ 550, em cinco parcelas, como indenização pela perda de sua lavoura com a chuva na hora errada no ano passado. O capataz lembra em seguida o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura (Pronaf), que financia investimentos na produção. Ele já fez três saques do Pronaf, por meio do Banco do Nordeste: comprou uma vaca com os primeiros R$ 1.000 e, depois, dois pares de novilhos, por R$ 1.500 cada. “Quando a crise pega, a gente vende a matriz (vaca) e fica com a cria”, descreve. “Tem resultado, não tem prejuízo.” Ele pagará R$ 500 este ano e R$ 1.000 em 2011. Das Dores conta que a vida de seu pai, aposentado de 89 anos, também “melhora todo ano”, graças aos reajustes do salário mínimo. Seu pai costuma dizer: “Ê, governo bom.”

“Aqui agora também tem aquele negócio do teste do pezinho”, acrescenta Manuel Valdevino da Costa Neto, o Manuel Sabaió, de 53 anos. Ele diz que sua filha de 17 anos tem um bebê de 7 meses, e está encaminhando os papéis para fazer o teste e receber em troca benefício de R$ 2.000. “Isso aqui nunca teve”, sentencia Sabaió.

Dos cinco, dois recebem Bolsa-Família. Damião Rodrigues da Silva, o Galego, de 36 anos, conta que ganha R$ 90. Ele tem um filho de 2 anos, e há três recebe o benefício. “Não foi difícil conseguir”, testemunha Galego, que com o auxílio compra gás e paga energia elétrica. “Não tem nada do governo que eu não goste”, resume. “O melhor presidente que entrou foi Lula.”

“Antes, a gente não ouvia falar nada dessas coisas que vêm acontecendo”, assegura Geraldo Oliveira, de 58 anos. “O governo de Fernando Henrique foi até mais ou menos.” Ele lembra, por exemplo, do Programa Vale Gás. “Nós recebeu num dia e cortou no outro”, recorda Oliveira, provocando risos entre os demais. Ele também recebe o Bolsa-Família: “Parece que é R$ 90. Quem recebe é a mulher. Não vejo nem a cor.” Mas diz que ela compra material escolar para os netos e paga as contas de água e luz dos três filhos que moram na cidade.

Sabaió recebeu o Bolsa-Escola durante três anos do governo Fernando Henrique e o Bolsa-Família dois anos do governo Lula. Perdeu o direito porque a venda do leite de suas vacas elevou sua renda acima do teto do programa, e porque seus filhos foram crescendo; José Duarte da Silva Júnior, de 25 anos, nunca recebeu porque é solteiro; Geraldo Oliveira, de 58, porque quando o programa chegou seus filhos já eram adultos.

O Programa Luz para Todos, também do governo federal, chegou há dois anos ao Riachão dos Pintos, onde Manuel Sabaió mora. Júnior vive na cidade, mas diz que o programa beneficiou seu pai, que mora numa localidade chamada Siriema. Galego, que mora em Casas Velhas, no município Poço José de Moura, ainda não foi alcançado pelo programa, apesar de ter feito o pedido há um ano. Ele gastou R$ 150 para estender a rede até sua casa. “Mas, quando chegar, eu arranco e vendo o poste.”

A simpatia por Lula é anterior a todos esses programas. “Votei todas as vezes em Lula, porque era nordestino e dava valor aos pobres”, explica Sabaió. Sua única crítica ao presidente é por não ter tirado do papel a transposição do Rio São Francisco, que ele considera que geraria muitos empregos no Nordeste. “Lula não vai sair este ano? Então, vai dar só um calor”, queixa-se. “Vamos ver se a candidata dele vai seguir”, continua Sabaió, referindo-se ao engajamento de Dilma Rousseff no projeto. “Acho difícil.”

“Eu voto na candidata de Lula”, atalha Júnior, com um chapéu de couro que lembra os cangaceiros que atravessaram essa caatinga há um século. As opiniões se dividem quanto a Dilma. O repórter pergunta se uma presidente mulher seria bom, e Júnior reitera que sim. “Se ele dissesse que não estava bom, ia ser preconceituoso”, coloca em dúvida Manuel Sabaió. “Eu fico no meio. Acho que não vai resolver tão bem igual o homem.” Mas pondera: “Se a mulher continuar o que ele (Lula) fez, tá bom.” Geraldo Zé das Dores discorda: “Às vezes, mulher resolve melhor que homem.” Oliveira é da mesma opinião: “Eu vou votar na mulher.”

Política mulher não é novidade para os moradores da região. Uiraúna, terra da ex-prefeita de São Paulo Luiza Erundina (PSB), é administrada pela médica Glória Geane (PSDB). Na vizinha Santarém da Paraíba, outra prefeita: Lucrécia Barbosa (PMDB).

À pergunta sobre se poderiam votar em José Serra, caso ele prometesse manter todos os programas sociais, Oliveira descarta: “Ele falou em entrevista no jornal que, se chegasse no poder, cortava.” A informação gera polêmica. “Corta não”, duvida Das Dores. “Se tem o poder, por que não vai cortar?”, insiste Oliveira.

Os lavradores dizem que não podem contar nem com o governo estadual nem com as prefeituras. Geraldo Oliveira dá um exemplo: na Emater, órgão de assistência técnica estadual, para tirar 10 kg de milho para plantar, é preciso deixar 20 kg de feijão. “Isso não é ajutório. ” A Prefeitura de Uiraúna cedeu no ano passado duas horas de trator para a colheita do milho, mas tarde demais, quando ele já estava “seguro” na espiga. “Perdemos a colheita. “

Em contraste, o governo federal os apoia, afirmam eles. Geraldo define assim o presidente Lula: “É o pai da Nação. ” Júnior tem uma justificativa simples para votar na candidata do presidente: “Tem que ajudar quem ajuda a gente. ” Ele conta que sua irmã, que tem um filho de 4 anos, ganha Bolsa-Família e recebeu pelo teste do pezinho. Além disso, Júnior conseguiu comprar sua moto no ano passado, em consórcio, com mensalidades de R$ 125. “Melhorou muito para nós com a entrada desse presidente. “

Galego também comprou sua moto, por R$ 4.800, com o salário que ganhou trabalhando na construção da Barragem de Capivara, que abastece seis municípios da região, onde antes faltava água. Ele recebia salário mínimo (na época R$ 480) mais R$ 120 de hora extra. “A obra ajudou muito. Deixou muita gente com moto zero. “

As motocicletas converteram-se num sinal da “prosperidade” em muitas zonas rurais pobres do Brasil. No agreste nordestino, elas substituem os tradicionais jumentos como meio de transporte, e os animais são vistos abandonados nas estradas de terra.

A Barragem de Capivara foi construída pelo governo estadual, com verbas federais conseguidas pelo deputado Wilson Santiago (PMDB-PB), que apoia Lula, dizem os moradores. São mais obras assim, como o asfaltamento da estrada que liga Uiraúna a Icó (Ceará), ou a transposição do São Francisco, que eles esperam do próximo governo, para gerar empregos formais.


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