Moderação da CNBB trouxe alívio

Na quinta-feira, presidente e secretário-geral da Conferência dos Bispos amenizaram declarações de d. José

 

As novas declarações da cúpula da Igreja sobre o aborto na menina de 9 anos estuprada pelo padrasto em Pernambuco causaram certo alívio nas paróquias. O anúncio da excomunhão da mãe da menina e dos médicos que realizaram o aborto havia causado perplexidade e indignação entre muitos fiéis e levou muitos padres a ter de dar explicações sobre a posição da Igreja.

Além de excluir dos sacramentos da Igreja a mãe da garota, os médicos e outros profissionais de saúde envolvidos na interrupção da gravidez, como enfermeiras, o arcebispo de Olinda e Recife, d. José Cardoso Sobrinho, ainda sugeriu que o estupro era menos grave que o aborto. Diante da forte reação negativa, a direção da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) deu entrevista coletiva, na quinta-feira, esclarecendo que a mãe não incorreu na excomunhão porque agiu para salvar sua filha, ao ser informada de que ela morreria se seguisse adiante com a gravidez. Quanto aos médicos, disse o secretário-geral da CNBB, d. Dimas Lara Barbosa, não há “elementos para dizer qual está excomungado”, pois “depende da consciência de cada um”.

A reparação foi bem recebida no interior da Igreja. “O bispo poderia ter sido mais comedido, mais prudente, menos radical e mais compreensivo”, critica o frei Benjamin Remiro, de 72 anos, da Igreja Nossa Senhora da Saúde. “A Igreja é mãe. Pode colocar as coisas de forma mais atraente para os fiéis. O modo como isso foi colocado não foi o mais fraterno e humano.” Com suas declarações, diz ele, a CNBB “agora torna as coisas mais claras e fornece mais critério para examinar o caso”.

“O que a CNBB tentou fazer foi mostrar que condenar é a última coisa com que a Igreja está preocupada, mas sim ajudar, salvar, olhar com positividade”, explica o padre Vando Valentini, de 60 anos, da igreja da Pontifícia Universidade Católica (PUC) e coordenador da Pastoral Universitária. Para ele, ninguém parecia estar preocupado com a menina, que “sofreu um mal quando foi estuprada e agora carrega o fardo do aborto para a vida inteira”.

Padre Vando lembrou a declaração do papa Bento XVI a propósito da eutanásia, em fevereiro, de Eluana Englaro, que vivia em coma havia mais de 17 anos na Itália: “A verdadeira resposta consiste em dar um testemunho do amor que ajuda a enfrentar a dor e a agonia de modo humano.”

“A postura da CNBB ajuda muito”, considera o cônego Severino Martins, da Igreja Assunção de Nossa Senhora, no Jardim Paulista. “Ela coloca as coisas no seu devido lugar. Não houve excomunhão, porque as pessoas não agiram de modo consciente, mas pressionadas.” Além disso, acrescentou o cônego, a CNBB manifestou “solidariedade com a família, que está sofrendo muito”.

“As declarações esclarecem um pouco mais a situação”, afirmou o padre Luiz Fernando Pereira, da Igreja São Judas Tadeu. “A Igreja está com um cuidado um pouco maior, porque se polemizou a ponto de criar uma imagem de que a Igreja está contra a vida, e isso é muito negativo. Para a Igreja, a vida está acima de tudo.”

CONTRA O ABORTO

No seu sermão de domingo, o padre Luiz Fernando condenou o aborto: “A gente tende a olhar para o sofrimento da menina de 9 anos, mas ela trazia seres humanos com a mesma dignidade que nós.” Ele lembrou que médicos consultados pela Igreja avaliaram que os bebês poderiam ser retirados no sexto mês de gestação. “Tinha risco, mas as crianças sairiam vivas”, disse o padre, de 34 anos, estudante de Psicologia. “A Igreja quer que todos vivam.”

O cônego Severino procurou explicar a comparação feita por d. José, enfatizando que uma mulher estuprada pode ser recuperada com assistência e solidariedade, “ao passo que no aborto não tem como voltar atrás”. Ele disse que, em 20 anos como padre, nunca viu um homem confessar um aborto, enquanto que muitas mulheres abortam pressionadas pelos homens e depois sofrem graves problemas de consciência. “No aborto, a mulher é sempre vítima”, disse Severino, de 45 anos. Ele não falou do assunto nos sermões, mas conversou com fiéis que lhe perguntaram a respeito.

Ao final da missa de domingo, o padre Michelino Roberto pediu que os fiéis da Igreja Nossa Senhora do Brasil se sentassem. Na mesma linha que seria adotada quatro dias depois pela CNBB, ele explicou que não era verdade que o bispo havia excomungado a mãe e os médicos. “Ele simplesmente informou a existência da pena, prevista no Código Canônico”, justificou o padre, de 43 anos.

Para o fiel Marcos Antonio Delfim, profissional de marketing de 46 anos, quem sairia perdendo caso a posição de d. José fosse mantida seria a Igreja. “Excomungar é muito radical, é levar a ferro e fogo”, diz Delfim, que frequenta a Igreja Assunção. “Não vejo nenhum peso na excomunhão. A pessoa muda para outra igreja.” 


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